Um Outro Olhar
segunda-feira, 29 de abril de 2019
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Casais homoafetivos contam histórias de adoção. Spoiler: com final feliz!
No Brasil, existem mais de 9.300 crianças e adolescentes à espera de serem adotados, de acordo com o Cadastro Nacional de Adoção, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Do outro lado, existem pais e mães que buscam um filho para fechar uma espécie de elo e formar uma família. No meio destes, estão os casais homossexuais. Pela legislação brasileira, não há qualquer diferença no processo de adoção por casais gays. Até por isso, não há estatística que mostre quantos casais formados apenas por homens ou apenas por mulheres adotaram crianças no Brasil.
O ritual segue o mesmo de um casal heterossexual: inscrição, curso de preparação, avaliação psicossocial dos pretendentes, entrevista técnica, inscrição na fila de adoção, estágio de convivência e adoção definitiva.
O que a lei permite de maneira tão fácil, porém, não reflete o que a sociedade pensa. Uma pesquisa realizada pelo Ibope mostrou que 55% dos brasileiros são contra a união estável e a adoção de crianças por casais homossexuais.
Mas quem resolve deixar as opiniões contrárias de lado e entrar nessa corrida, só tem boas histórias para contar.
Jorge, Walter e Arthur, no Rio Imagem: Arquivo Pessoal.
Tive medo que não nos aceitassem
Jorge Luiz Brasil Ninho, 50 anos, jornalista, e Walter do Patrocínio, 54 anos, farmacêutico, de Niterói (RJ), são pais de Arthur, de 11 anos.
O nosso desejo de adotar uma criança nasceu há 14 anos. Chegamos a dar entrada no processo, mas uma série de contratempos nos obrigou a parar a busca. Esse desejo ficou quietinho até que 10 anos depois voltou com muita força. Mas eu tinha receio da nossa habilitação não ser aceita por sermos um casal homoafetivo.
Mesmo assim resolvemos ir em frente. Pensamos, no primeiro momento, em uma criança entre dois e quatro anos. Mas o tempo amadureceu nossas ideias e decidimos pela adoção tardia -- quando a criança tem mais de seis anos. Contamos com a ajuda de uma ONG que emite comunicados com listas de crianças nesse perfil disponíveis em todo país.
E foi aí que conhecemos o Suênio, que hoje é o nosso Arthur. Na época, com seis anos. Desde o primeiro contato, falamos abertamente sobre o fato de ter dois pais. E só levamos a adoção à frente quando tivemos certeza que ele poderia lidar bem com isso.
Foi um processo longo e burocrático em que passamos por momentos bem angustiantes. Um deles foi a expectativa pelo parecer do juiz porque ainda não havia tido um caso como nosso, de um casal homoafetivo adotando uma criança, na comarca de Niterói. E quando o Arthur chegou, tivemos que lidar com a sua adaptação. Na primeira semana ele estava muito agitado e até tentou fugir da escola que o matriculamos. Respiramos fundo e tentamos fazer com que se sentisse mais seguro e confiante.
Uma semana depois, ele estava mais calmo e feliz e começou a nos chamar naturalmente de pai. Nunca passamos por nenhuma situação de preconceito. E nem damos espaço para que isso aconteça. Se tem festa do Dia das Mães na escola, eu o deixo participar. Se tiver alguma atividade, como uma dança com as mães num palco, eu danço com ele. Não percebo nenhum desdém ou deboche. E se um dia acontecer, ele será enfrentado com muito amor. E se for ofensivo, levaremos à Justiça.
Essa criança mudou tudo em nossa vida. Absolutamente tudo. Emocionalmente, psicologicamente, financeiramente, socialmente, fisicamente. Vida pessoal? Esquece. Não existe mais. Hoje só existe a vida com ele. Mas não é ruim. Pelo contrário: é maravilhoso. Nem consigo me lembrar como era nossa vida sem ele. Arthur é o que faz nossos corações continuarem batendo e o que nos move a levantar da cama todos os dias para amá-lo."
Ninguém nos tratou diferente no processo de adoção
Monica Drumond de Araújo, 51 anos, administradora, e Jeanne Tostes Drumond, 52 anos, cirurgiã dentista, de Lagoa Santa (MG), são mães da Giovanna, de 6 anos, e da Lorena, de 4 anos
Eu e a Jeanne estávamos há oito anos juntas, quando decidimos que era hora de termos os nossos filhos. Como nós duas já éramos histerectomizadas, a adoção foi o caminho para formarmos nossa família. Passamos por todo o processo normal de habilitação. Nunca fomos tratadas de forma diferente por sermos um casal homossexual. Em alguns momentos, nos sentimos até beneficiadas.
Primeiro, recebemos a Giovanna. Na época ela era recém-nascida e foi emocionante pegá-la no colo pela primeira vez. A primeira noite foi muito complicada. Ela dormiu direto e eu e a Jeanne ficamos ao lado dela até o amanhecer acompanhando o sono e certificando de que respirava. Depois, decidimos entrar na fila novamente.
Passamos pelo processo mais uma vez e recebemos a Lorena, na época com nove meses. Preconceito é algo que não nos afeta. Elas cresceram com duas mães e encaram isso com muita naturalidade. Eu sou a Mamamon e a Jeanne é a Mamathih, ou simplesmente, mamães. Quando nos chamam, sabemos pelo tom de voz, qual mãe elas querem naquele momento.
Conversamos muito e contamos a elas que não nasceram das nossas barrigas, mas que outra pessoa as fez para nós. Conforme elas vão crescendo e as curiosidades aumentando, podemos ir nos aprofundando no assunto. A emoção e a alegria não dão espaço para outro sentimento que não seja paixão pelas nossas filhas. Moramos numa cidade pequena e aqui somos uma família muito querida, aceita e respeitada. Pensamos em dar para as meninas todos os valores e referências para que sejam pessoas de bem e que no futuro continuem mudando a vida das gerações que virão a partir da nossa, com amor, respeito, cuidado e proteção."
Um Outro Olhar
sexta-feira, 26 de abril de 2019
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Exame Fórum Diversidade
Diversidade “faz toda a diferença” nestas quatro gigantes dos negócios
São Paulo – Etnia, cor de pele, idade, gênero, religião, orientação sexual, identidade de gênero, deficiências, classe social…A lista de singularidades humanas é tão diversa quanto a própria sociedade. Felizmente, algumas empresas já começam a acolher toda essa diversidade como uma fonte de riqueza, algo que torna as organizações e o mundo mais sustentáveis e justos.
Ao reconhecerem a diversidade como fator de inovação, criatividade e vantagem competitiva, elas se esforçam para criar um ambiente de trabalho onde todos se sentem bem e confortáveis em se expressar, um exercício que exige dedicação e esforços diários.
Durante o Forum EXAME Diversidade, reallizado na quarta-feira (27/03/19), quatro empresas de referência em seus respectivos setores discutiram como os negócios podem contribuir para a valorização da diversidade, impactando positivamente a sociedade e as próprias companhias.
Carrefour
Como uma empresa de varejo, temos o desafio de lidar com a diversidade e inclusão todos os dias. O varejo é um recorte da sociedade brasileira, temos todos os perfis representados na nossa companhia e lidamos com milhões de consumidores”, afirmou a pernambucana Karina Chaves, gerente de diversidade e inclusão do Carrefour.
Em 2013, a rede criou um comitê dedicado à diversidade com atuação transversal, por entender que este não é um tema específico de uma área, mas do negócio como um todo.
O Carrefour montou uma plataforma de diversidade que opera em quatro frentes: 1) promover a igualdade de oportunidade e de tratamento, considerando as diferenças e desigualdades presentes na sociedade; 2) promover um ambiente de trabalho respeitoso, acolhedor e focado no que é essencial para a empresa; 3) aprimorar as práticas de gestão empresarial por meio de aprendizados com os diferentes públicos e parceiros; 4) contribuir para criar referenciais competitivos ao considerar a diversidade como fonte de valor.
Para atingir esses objetivos, é essencial manter a cultura da diversidade viva e repensar processos. Há todo um aprendizado em procedimentos internos para ser alcançado”, destacou Karina. “Ainda assim com tudo o que fazemos, há sempre riscos, porque cada pessoa tem sua própria história. Como sociedade, temos ainda muitos preconceitos e racismos enraizados. Mas acredito no poder educacional das empresas”.
Cargill
A gigante global dos alimentos Cargill tem ações especificas voltadas à inclusão e diversidade nas suas operações no Brasil, que empregam 10 mil pessoas. Em 2016, formou um comitê de igualdade, com iniciativas transversais que reúnem funcionários interessados no assunto.
Esse movimento originou redes de atuação temáticas, como a AfroCargill, focada em igualdade étnico-racial e a PRIDE (palavra que significa “orgulho”, em inglês), para promoção de um ambiente seguro e que valorize profissionais gays, lésbicas e outras minorias. Também criou a MOB, sigla da rede Mulheres Operando no Brasil, cuja missão é incentivar as mulheres e seus potenciais para crescimento e liderança na empresa.
Empenhada em criar e manter um ambiente de trabalho inclusivo e diverso, desde 2017, a Cargill tem empregado diversas mudanças em seu processo seletivo, tanto para vagas de estágio quanto de liderança. Inspirada em modelos de recrutamento europeus, passou a contratar profissionais por meio do “currículo cego”, no qual o recrutador não sabe o gênero nem identidade do candidato.
O objetivo é eliminar o viés consciente ou inconsciente na contratação e estimular a contratação de profissionais por suas qualificações e competências, e não por gênero, cor, orientação sexual ou idade”, explicou Simone Beier, diretora de Recursos Humanos (RH) da Cargill no Brasil.
Segundo a executiva, o engajamento dos funcionários e dos líderes das redes, que são voluntários, é um diferencial para a promoção da diversidade na empresa.
Isso vai contagiando outras pessoas, e daí surgem novas sugestões por conta desse ambiente favorável para engajamento”, afirma Simone. Em um estudo global da empresa, 84% dos funcionários do Brasil disseram que se sentem confortáveis em ser quem são na companhia.
Simone Beier, diretora de Recursos Humanos (RH) da Cargill
Accenture
Na consultoria Accenture, a agenda de diversidade está totalmente conectada com o negócio, que lida com perfis de clientes variados, do varejo ao financeiro. Para Beatriz Sairafi, diretora de RH da empresa, a promoção de valores de inclusão não acontece sem “patrocínio da liderança”.
Temos a meta de alcançar 50% de equidade entre mulheres e homens até 2030”, conta. “Um dos pilares da empresa está ligado às práticas, que devem ser abertas e inclusivas para todos”.
Na Accenture, o nascimento de um filho dá direito à licença igual tanto para as mães quanto para os pais, além do benefício de creche para ambos.
O que transforma o ambiente interno é ter praticas que empoderam os colaboradores”, acrescenta a executiva. E lá, isso é praticamente um mantra.
Grupo Boticário
No Grupo Boticário, além de um valor, diversidade é uma das seis competências pelas quais os gestores são avaliados. Há inclusive uma área de dados que permite estratificar todos os 12 mil colaboradores do grupo por singularidades, como etnia, cor de pele, gênero e classe social.
É uma fonte rica de insight para os gestores trabalharem o aperfeiçoamento de pessoas e grupos na empresa”, destaca Alvaro Garcia, diretor de marketing de “quem disse, berenice”, uma das marcas do Grupo Boticário, ao lado de O Boticário, Eudora, The Beauty Box, Multi B e Vult.
Além de fazer parte dos valores organizacionais da companhia, o tema da diversidade envolve todos os públicos do Grupo. E os consumidores não são exceção.
Por meio do nosso programa de consumidor oculto, pessoas de diferentes perfis visitam nossos pontos de venda se passando por um consumidor comum para avaliar o atendimento, conforme suas necessidades específicas. A partir dessa experiência, melhoramos o que for preciso, como treinar um colaborador para ajudar uma pessoa com deficiência visual a se maquiar ou falar sobre cores”, exemplificou o executivo.
Se a diversidade faz parte da cultura e dos valores organizacionais da companhia, ainda carrega estigmas pesados na sociedade brasileira. O Grupo “sentiu na pele” esses preconceitos quando lançou em 2015 a campanha de Dia dos Namorados, do Boticário, que mostrou diferentes tipos de casais, heterossexuais e homossexuais, trocando presentes. A propaganda virou alvo de protestos e ameaça de boicote à marca nas redes sociais e até de denúncia ao Conar.
No ano passado, o alvo das críticas foi o comercial da marca retratando uma família negra para o Dia dos Pais.
Em ação recente, quem disse berenice? retratou casais heteros, amigos e homossexuais se beijando. Perdemos mais de 14 mil seguidores nas redes sociais, mas ganhamos mais de 10 mil”, conta Alvaro.
Para o executivo, há um aprendizado em todos os esforços das empresas para promover a diversidade, tanto internamente quanto externamente.
Diversidade não é um fim, mas uma jornada. Há sempre oportunidades para dar novos passos. Se cada indivíduo colocar seu tijolinho ali e fizer a sua parte, nós construiremos o monumento da diversidade. É um trabalho em conjunto”.
Alvaro Garcia, diretor de marketing de “quem disse, berenice” da Boticário
Um Outro Olhar
quarta-feira, 24 de abril de 2019
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Foto: Reprodução/Facebook/Jessy Oliveira
Casal de lésbica sofre homofobia em motel: 'Se fosse um casal hétero teria vaga'
Casos de homofobia continuam vindo à tona todos os dias e a jovem paulistana Jessy Oliveira foi mais a entrar nas estatísticas. Em um grupo no Facebook, ela conta que ao tentar comemorar três anos de relacionamento com sua namorada em um motel na zona leste de São Paulo, elas foram impedidas de entrar por serem lésbicas.
No post, Jessy conta que foi informada pelo telefone que a entrada no local era permitida após 1 da manhã. Ela e a namorada então chamaram um Uber próximo do horário e ficaram aguardando na frente do UNOTEL, na Avenida Aricanduva.
Era 00h58 quando chegamos ao motel e tinham dois carros na nossa frente. Quando chegou nossa vez, a atendente olhou para dentro do carro e gritou: ‘está tudo lotado, não têm vagas’. Estávamos alterando o endereço da viagem para nossa casa quando chegaram mais dois casais”, relata.
O casal em questão era heterossexual e logo que abordaram a atendente na recepção, ela apresentou alguns quartos disponíveis.
Desci e fui perguntar se tinha quarto, pois ela havia acabado de deixar um casal entrar após efetuar o pagamento. Ela gritou: ‘não moça, já te falei que não tem quarto, eles entraram para esperar e ver se tem vaga para eles’. Aí perguntei o motivo dela não ter oferecido que esperássemos também e ela falou mais alto ‘porque já te disse que não têm quartos’.
Agressividade
Em entrevista ao Yahoo, Jessy contou que foi a primeira vez que tentou ir ao motel e que se surpreendeu com a atitude da atendente.
Em nenhum momento ela mencionou nossa sexualidade, simplesmente disse que não haviam quartos disponíveis. Mas o tom foi agressivo”.
A certeza de que se tratava de um caso de homofobia veio logo depois de dois casais terem sido avisados que haviam quartos disponíveis.
Só não havia vaga para minha esposa e eu (duas mulheres), pois se fosse um casal hétero teria”. Ainda de acordo com Jessy, o motorista do Uber incentivou as jovens a tomarem medidas judiciais. .
Medidas legais
O caso aconteceu no dia 6 de abril e Jessy entrou em contato com o motel para esclarecer o ocorrido, além de ter feito uma queixa no Reclame Aqui.
Ela decidiu esperar pela resposta do estabelecimento para tomar alguma medida judicial e disse que ela e a namorada se sentiram muito mal com a situação.
Desfecho
Na tarde do dia 17, o UNOTEL finalmente entrou em contato com Jessy e a resposta foi inesperada:
Eles disseram que deve ter sido um mal entendido ou então que a atendente não estava em um bom dia porque, para eles, não aconteceu homofobia. Até porque a atendente também é lésbica“, dizia o comunicado.
Jessy e sua namorada foram convidadas a voltar ao motel para uma noite grátis.
A atendente pediu para eu ir um dia lá e disse que vai me dar uma diária sem cobrar, para entender melhor o que aconteceu”.
Fonte: Yahoo Vida e Estilo, por Higor Dorta, 18 de abril de 2019
Um Outro Olhar
segunda-feira, 22 de abril de 2019
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Filme sobre 'cura gay' sem maniqueísmos estreia nos cinemas brasileiros
Dois meses atrás, "Boy Erased", filme crítico sobre a chamada "cura gay", passou reto pelos cinemas brasileiros e foi direto para o DVD, apesar de seu elenco hollywoodiano e indicação ao Globo de Ouro. Razões comerciais, segundo a sua distribuidora.
Por ironia, outro longa com a mesma abordagem sobre o assunto, mas sem nomes estrelados, estreiou no país na quinta (18) até mesmo em sala de shopping center.
A cineasta Desiree Akhavan se surpreende ao saber.
Tivemos que lutar muito para que o nosso filme estreasse nos cinemas aqui nos Estados Unidos, enquanto Boy Erased' teve um lançamento grande."
Nem mesmo o fato de ter sido o grande premiado do Festival Sundance, a meca da produção independente, ajudou.
Acho que tem a ver com o fato de lidarmos com sexualidade feminina, com a história de uma garota que se masturba e tem desejos", crê.
Ambas as produções partem de livros. Em Boy Erased (ed. Intrínseca), o americano Garrard Conley narra as memórias de quando foi levado pelo pai, um pastor batista, a um desses locais que se propõem a reorientar gays. Narra como um psicólogo dali aplicava jogos mentais nos frequentadores e incentivava exorcismos.
Cameron Post (ed. HarperCollins) é o romance juvenil escrito por Emily M. Danforth, inspirado em uma experiência do mesmo tipo, só que com uma adolescente lésbica.
Ambos os filmes abordam a inspiração religiosa que guia esses centros, evocam suas normas peculiares, como a revista de pertences para proibir a entrada de itens profanos, e o senso de inadequação dos protagonistas diante das arbitrariedades de seus líderes.
Enveredam, assim, por esse quase gênero cinematográfico que é o do filme de internação. São praticamente versões LGBT teens de Um Estranho no Ninho.
Mas as semelhanças terminam aí.
Boy Erased está mais para uma (mal sucedida) tentativa de fazer bom-mocismo com pautas identitárias e chamar a atenção ao escalar atores como Nicole Kidman e Russell Crowe para papéis centrais. Vem também de um diretor, Joel Edgerton, com pouca ligação com a causa.
Já O Mau Exemplo de Cameron Post faz jus ao pedigree indie, que lhe rendeu prêmio em Sundance, com produção mais modesta, mais sutileza e menos atores famosos. Sua diretora também é um nome conhecido em produções que resvalam na temática gay e lésbica.
O filme também deixa de lado o maniqueísmo que marca Boy Erased e opta por não tratar religiosos como vilões nem os frequentadores desses centros como incautos vítimas de lavagem cerebral.
Não queria transformá-los numa piada", explica Akhavan. "A esquerda liberal não gosta muito da ideia, mas eu queria falar da humanidade que existe mesmo nos que defendem essas formas de terapias."
Chloë Grace Moretz (Deixe-me Entrar) interpreta a personagem-título, uma adolescente órfã que é flagrada pelo namorado aos beijos com uma outra menina. A tia a obriga a frequentar o Promessa de Deus, programa mantido por psicólogos evangélicos em algum lugar não especificado dos rincões americanos.
Ali, Cameron aprende que o desejo homossexual é a ponta do iceberg de uma série de questões que só a religião irá sanar. O ano é 1993. Sem internet para conhecer histórias de outras lésbicas, a sensação de inadequação e solidão da garota é maior. É naquele centro, contudo, que encontrará mais gente como ela.
Nova-iorquina filha de iranianos, a diretora usou no filme parte de suas experiências num retiro destinado a pessoas com sobrepeso.
Para mim, foi bom. Cheguei odiando todas as pessoas que também estavam ali e aos poucos passei a ver traços meus em cada uma delas."
Isso ajuda a explicar o seu olhar um pouco mais generoso aos demais personagens que, assim como Cameron, são submetidos às regras do Promessa de Deus, incluindo aí os que as respeitam cegamente, seja lá por que razão.
Durante as filmagens do longa, no segundo semestre de 2016, Donald Trump acabou eleito, levando a tiracolo o seu vice, Mike Pence, religioso e entusiasta fervoroso desse tipo de terapia de reorientação sexual.
Não mudou a nossa abordagem, mas trouxe um senso de urgência para o filme", explica Akhavan.
Antes, nos preocupávamos se seria relevante tratar do assunto naquele momento. Aquilo, então, deixou de ser apenas retórico."
Fonte: GaúchaZH, 17/04/2019
O Mau Exemplo de Cameron Post: Diretora explica como equilibrar drama e humor em filme sobre a "cura gay"
Chegou aos cinemas, na quinta passada, o vencedor do prêmio do júri no Festival de Sundance: O Mau Exemplo de Cameron Post, drama sobre as terapias de "cura gay" nos Estados Unidos. Chloë Moretz interpreta uma garota levada a um acampamento cristão após ser flagrada fazendo sexo com uma amiga.
Desiree Akhavan
O drama demonstra a violência psicológica destes procedimentos, que levam os jovens a "odiarem a si mesmos", nas palavras de Cameron. Ao mesmo tempo, o filme permite abordar o tema com leveza e humor, destacando as amizades formadas dentro do acampamento God's Promise ("Promessa de Deus").
O site AdoroCinema conversou com a diretora Desiree Akhavan sobre o projeto, adaptado do livro de Emily M. Danforth:
Como você conheceu o livro e o que te fez acreditar que renderia uma boa adaptação para o cinema?
Desiree Akhavan: O livro foi presente de uma amiga. Eu amei e dei para a minha namorada imediatamente. Na verdade, não foi minha ideia transformar em um filme, minha namorada na época amou também e disse: “Isso vai dar um ótimo filme”. Eu estava muito intimidada porque eu era uma grande fã do livro, eu não queria arruinar ele. Eu não sentia que era digna de readaptar esse livro, mas era uma coisa que eu pensava constantemente.
Quando eu lancei meu primeiro filme e estava viajando com ele, minha produtora disse: “Eu acho que a gente tem que transformar esse livro em um filme” e quando ela me disse que tinha amado, eu confiei nas pessoas ao meu redor porque eu não tinha confiança para fazer sozinha. Foram essas pessoas ao meu redor que disseram: “Você deve ir em frente”.
Quais foram as principais mudanças e concessões que você teve que fazer para adaptar o livro?
Desiree Akhavan: O livro tem 500 páginas, é muito longo. Além disso, ele começa quando Cameron tem 11 anos e vai até os 17 anos. A primeira coisa que eu sabia é que queria restringir as ações somente ao que aconteceu no acampamento God’s Promise. Então, nós nos ativemos principalmente a essa locação e a um pouco da vida dela antes. Esse era o meu foco: eu me ative à personagem.
Filme e literatura são meios muito diferentes. O filme é muito simplista, ele não fornece muito espaço para se aprofundar. Você pode fazer, mas não vai ser tão detalhado quanto o livro. Então, grande parte do trabalho consistiu em transportar a essência e manter a história o mais simples possível. Eu e minha co-escritora, Cecilia Frugiuele, demoramos um ano para conseguir isso.
Como você preparou o elenco? Fizeram pesquisas sobre outros grupos de conversão ou você queria que os atores se ativessem ao roteiro?
Desiree Akhavan: Eu queria que eles fossem verdadeiros com o roteiro. Chloe [Grace Moretz] e eu nos encontramos com vítimas da terapia de conversão gay, então ela conversou com pessoas que sofreram traumas. Mas eu, minha co-escritora e a escritora do livro pesquisamos muito, porque nós três sabíamos que se tratava de algo muito íntimo.
Para os jovens atores, preferia que eles sentissem como se estivessem em uma dessas comédias passadas na escola. Não queria que reforçassem a gravidade do tema. Para muitas pessoas que passaram por essas terapias, esta foi a primeira vez que conheceram outras pessoas gays na vida. Apesar de estarem em uma época terrível, eles também estavam se conectando com indivíduos LGBT pela primeira vez, então não deixa de existir algo carinhoso.
Como você decidiu que formas de violência mostrar ou apenas sugerir no filme?
Desiree Akhavan: Bom, isso foi um reflexo do livro. Nós vemos o mundo pelos olhos de Cameron e a personagem não está em todos os lugares. Ela não está junto de Mark (Owen Campbell) quando ele se mutila, por exemplo. Enquanto cineasta, eu queria que o espectador acompanhasse o mundo dela e foi por isso que optamos pela coerência com este único ponto de vista. Não precisamos ver o horror. Ele está presente quando Mark tem um colapso, durante a sessão em grupo, e se nós fizemos nosso trabalho direito, o espectador vai sentir a violência deste colapso na terapia.
Você diria que se trata de um político, ou que tenha uma mensagem a transmitir?
Desiree Akhavan: Qualquer filme que tenha algo novo a dizer é político. Eu só não quero que as pessoas assistam a isso e sintam que que estão tomando uma dose de remédio, que estão recebendo uma prescrição. Desde a infância, a maioria dos filmes nos diz o que é certo e o que é errado, seguindo um tipo de narrativa moralista.
Eu sempre fico animada quando assisto a algo que desafia minhas crenças, que desafia minhas expectativas. Então, sim, eu acredito que seja um filme político, mas, ao mesmo tempo, eu não acredito que tenha uma mensagem única a passar, nem que esteja julgando os jovens ou os líderes dessa terapia de conversão gay.
Os líderes da "cura gay" poderia soar como vilões, inclusive, mas você evita este caminho.
Desiree Akhavan: Sim, eu pensei que se fizesse meu trabalho direito, os espectadores sentiriam empatia por Lydia (Jennifer Ehle) e Rick (John Gallagher Jr.), entenderiam de onde eles vêm e porque chegaram onde estão. Para mim, como diretora, este era um desafio muito maior que representá-los como vilões. Seria mais interessante como espectador e muito mais desafiador realmente ter empatia por alguém nessa posição.
Mesmo assim, existe uma violência psicológica evidente neste acampamento. Quem você culparia pelos maus tratos: os líderes do acampamento? Os pais que internaram os jovens? Uma ideologia maior?
Desiree Akhavan: Acredito que todos estes sejam responsáveis. Quem você culpa por alguém como Donald Trump no poder, por exemplo? É o medo. Nós vivemos em um mundo de medo, onde as pessoas têm medo de qualquer coisa diferente do que elas estão habituadas. Quando seu filho é gay mas você é hétero, para algumas pessoas esse é um território desconhecido que eles não desejam enfrentar. Então, eles tentam fazer com que você seja com os outros. Então, sim, você culpa o medo, você culpa o governo, você culpa a cultura em que vivemos, você culpa os pais destes jovens.
Mas o que era difícil e interessante para mim era pensar: “Eu sempre quis fazer um filme sobre abuso infantil, mas eu não queria que fosse do mesmo jeito que sempre vi nas telas, de modo pesado e trágico. Enquanto crescia, eu descobri que o abuso sempre vem das pessoas que mais te amam e têm as melhores intenções. Elas estão munidas de discursos carinhosos do tipo: “Eu quero o que é melhor para você”. Isso era muito mais doloroso e muito mais interessante para mim como artista do que sugerir que existem pessoas boas e outras más.
Que reações o filme despertou desde o Festival de Sundance?
Desiree Akhavan: Eu fico muito grata que as pessoas tenham se identificado com Cameron e sua história. Fiquei surpresa com a quantidade de heterossexuais que se identificaram e enxergaram a sua própria adolescência no filme. Eu fiquei preocupada que o filme pudesse dialogar apenas com homossexuais, mas percebi que esta é uma história muito mais universal, e tenho muito orgulho disso. O senso de humor torna essa história muito mais universal.
Que experiências deste filme você vai levar para seus próximos projetos?
Desiree Akhavan: Esse filme foi uma verdadeira colaboração entre muitas mulheres inteligentes da minha vida. Minha co-escritora e produtora Cecilia Frugiuele, minha fotógrafa Ashley Connor, minha editora Sara Shaw. Eu estava muito calma, este era o meu segundo filme e eu queria aproveitar a experiência, para falar a verdade.
No meu primeiro filme eu estava tão nervosa, com medo de ser julgada, que não senti nenhum prazer em filmar. Neste filme eu deixei fluir, deixei as pessoas discordarem e foi prazeroso por causa disso. Esse filme foi melhor porque eu deixei acontecer e tive minhas colaboradoras na mesa comigo. Cada uma delas trouxe isso, então meu trabalho foi possível pela confiança nas pessoas.
Fonte: Adoro Cinema, por Bruno Carmelo, com a colaboração de Maria Clara Guedes, 19/04/2019
Um Outro Olhar
terça-feira, 16 de abril de 2019
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Videomaker Rita Moreira faz videobiografia de feminista histórica Ti-Grace Atkinson
Lá pelo meio da conversa com a videomaker Rita Moreira, 74 anos, ela se apresenta: "Sou lésbica, feminista radical e de esquerda". Não que fosse preciso dizer. Àquela altura, Moreira já havia exibido para o blog seu vídeo mais recente, uma "biografia de ideias" da ativista norte-americana Ti-Grace Atkinson, 80 anos, que foi fortemente influenciada pela filósofa francesa Simone de Beauvoir (1908-1986) e ficou conhecida como uma das pioneiras do lendário Women's Movement, criado no início dos anos 1970.
Simone de Beauvoir é considerada um ícone do feminismo contemporâneo. Seu livro "O Segundo Sexo" (1949) tornou-se um clássico sobre a opressão às mulheres. Companheira indissociável do filósofo Jean-Paul Sartre (1905-1980), com quem manteve um relacionamento aberto durante a vida toda, ela partilhava com ele da filosofia existencialista, cuja base são experiências humanas concretas, digamos, prosaicas, e não apenas elaborações do sujeito pensante. Com Sartre e Michel Foucault (1926-1984), Beauvoir assinou a polêmica Lettre ouverte sur la révision de la loi sur les délits sexuels concernant les mineurs (Carta aberta sobre a revisão da lei sobre ofensas sexuais envolvendo menores), publicada pelo jornal Le Monde em 1977. Na França, a idade mínima de consentimento para relações sexuais era 15 anos.
Lesbianismo político
Entre as ideias pregadas por Ti-Grace Atkinson, estão a analogia entre "feminismo radical" e "lesbianismo político" (forma de relacionamento sem caráter sexual, mas voltado à união visceral de mulheres pela mesma causa); o "separatismo" ("as mulheres devem se unir sem a presença do homem, para se definirem através de si, e usarem a raiva para ir adiante"); e, ultimamente, a convicção de que as trans não devem participar de manifestações feministas, "já que a questão de gênero não diz respeito ao movimento e sim aos direitos humanos").
Atkinson, à esquerda, e mais três pioneiras do feminismo: "Olha que lindinha!" (Foto: Reprodução).
Olha que lindinha!
Rita Moreira conhece Atkinson desde o começo dos anos 1970, quando morou em Nova York com a então companheira na vida pessoal e profissional, Norma Bahia Pontes. Fã incondicional da filósofa, mantém em casa diversas fotografias emolduradas dela. "Olha que lindinha! A Ti é a da esquerda", aponta a videomaker, quando a imagem de quatro feministas radicais aparece na tela.
Moreira afirma que tudo o que ela pensa está na videobiografia de Atkinson. E faz suas as palavras dela.
Os trans, os negros e os homens não têm nada que ficar tirando lasquinha das nossas passeatas. A gente não vai na deles!"
Ela não se conforma com as consequências que o debate sobre as questões de gênero trouxeram para as mulheres:
Agora, a gente tem tido que explicar que somos mulheres nascidas mulheres. É o cúmulo! Só existem dois sexos: o ser humano nasce com um pinto ou uma xoxota. Aí, dizem que a gente é contra trans!"
Rita Moreira com Norma Pontes Bahia, companheira dos tempos em que morou em Nova York (Foto: Reprodução)
Atkinson tem legião de fãs
Apesar de atrair uma legião de fãs, Atkinson não era lésbica nem tampouco manteve relacionamentos com homens — o que só aumentava o mistério em torno dela. "Mistério, não!", exalta-se Rita. Então ela era assexuada? Mais gritos. "Isso não vinha ao caso! Ela considerava as instituições como o casamento, a maternidade e a religião os fundamentos da opressão da mulher." Mas não podia nem transar? "Você não entendeu nada!", continua Rita.
Nas entrevistas do filme, Atkinson aparece usando óculos redondos com lentes acinzentadas, à francesa, ou muito grandes, de armação transparente. Mantém uma postura de intelectual séria, ri pouquíssimo e pensa muito antes de soltar elaborações como: "Só porque você está viva, não significa que você tem uma vida." Onde quer que ela fosse, sempre havia uma câmera para captar sua imagem: ora esbravejando com policiais em uma marcha política, ora falando a feministas embevecidas, ou simplesmente atravessando uma rua com uma legenda. "Ela detestou esse cabelo", lembra Moreira, em uma das entrevistas do vídeo.
Três momentos de Atkinson: em manifestação pelo impeachment do presidente Richard Nixon; em entrevista recente; e em outra, no começo dos anos 1970 (Foto: Reprodução)
Quem tem ódio de quem
Na esteira do discurso de Atkinson, Rita Moreira afirma: "As pessoas costumam dizer que as feministas radicais têm ódio de homens. Mas pega as estatísticas de violência doméstica, e vê quem odeia quem. Só em janeiro, foram 117 mulheres mortas por companheiros no Brasil." Comento, sem números, que possivelmente os homens que batem em mulheres não são a maioria. Ela: "Claro que há homens bons. Deve haver até muçulmano legal…"
Ainda assim, Moreira acredita que as mulheres são mais "valentes".
Desço aqui na (avenida) Paulista, para observar o movimento de manhã cedo, vejo que elas já estão com as banquinhas armadas vendendo café, enquanto os homens estão largados pelo chão."
Padrão contrarrevolucionário
A octagenária Ti-Grace, que chegou a comparar o casamento à escravidão e que, quando perguntaram qual seria o possível substituto, respondeu "o câncer", lamenta profundamente que o atual movimento gay tenha adotado a instituição.
As feministas dos anos 70 não cairiam nisso. Hoje, elas acham que se juntar ao que é aceitável pela sociedade é a resposta. Por isso que eu digo que o sentimento precisa ser muito bem analisado, caso contrário pode reproduzir um padrão antigo, contrarrevolucionário."
Em relação ao casamento heterossexual, especialmente no Brasil, ele se tornaria inviável por causa da violência doméstica. Moreira, que foi casada (ou morou junto) com algumas mulheres, pergunta:
Como pode, com esse feminicídio, ainda haver tanta mulher querendo se casar?"
Incrível retrocesso
Sobre as mulheres e o feminismo que se pratica atualmente, Atkinson afirma que, "fora pouquíssimos avanços que podem ser retirados (como a eventual liberação do aborto)" vivemos um período de incrível retrocesso.
Voltamos aos anos 1930", diz. "Nos tornamos coniventes com o subjugo, em parte para sobreviver. Ver-nos diminuídas permanentemente é intolerável. Por outro lado, acho o movimento #metoo interessante, mas não busca respostas profundas." Iniciado em 2017 pela ativista norte-americana Tarana Burke, o #metoo levou mulheres do mundo todo a declarar publicamente que sofreram assédio sexual.
Fonte: Universa, Blog do Paulo Sampaio, 15/04/2019 (editado)
Um Outro Olhar
segunda-feira, 15 de abril de 2019
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Atrizes Natalia de Molina (esq.) e Greta Fernandez, de 'Elisa y Marcela', no Festival de Berlim - Fabrizio Bensch/Reuters
Drama lésbico causa controvérsia em Berlim por ser produção da Netflix
Assim que o logotipo da Netflix pintou na telona, as vaias irromperam na sala do Berlinale Palast, onde os filmes do Festival de Berlim são exibidos.
“Elisa y Marcela”, drama de época da espanhola Isabel Coixet, é a cizânia da vez. Por ser uma produção da empresa americana de vídeo sob demanda, a sua escalação para competir ao Urso de Ouro é controversa.
Redes alemãs de cinema protestaram contra a presença da obra nesse que é um dos eventos mais importantes do mundo. Numa carta aberta enviada à organização e ao Ministério da Cultura alemão, 160 exibidores independentes exigiram que o filme de Coixet fosse retirado da disputa. “O festival defende a tela grande, a Netflix defende a tela pequena.”
A diretora espanhola Isabel Coixet
A diretora disse que o documento é um “desrespeito” ao seu trabalho e ao da equipe de filmagem.
Entendo as razões das salas de cinema, mas não é justo dizer que o filme não mereceria estar aqui”, falou aos jornalistas. “O futuro passa pela convivência das várias plataformas.”
Diretor do festival, Dieter Kosslick se negou a retirar o longa da competição e afirmou que as grandes mostras cinematográficas precisam chegar a um entendimento comum sobre como lidar com a presença de produções do streaming em suas respectivas programações.
Cannes é inflexível e não permite produções que não passarão pelas telas dos cinemas. Veneza é bastante aberta a isso, tanto é que “Roma”, de Alfonso Cuarón, estreou por lá e saiu com o prêmio principal. Berlim adotou uma postura intermediária. Kosslick disse que permitiu a participação de “Elisa y Marcela” porque o filme será, ao menos, exibido nas salas espanholas.
Se ele for bem na Espanha, espero que viaje para outros países e passe no Brasil, onde estão prestes a banir o casamento gay”, disse Coixet. Ela se refere possivelmente à onda conservadora na política nacional.
“Elisa y Marcela” empunha a bandeira da união entre pessoas do mesmo sexo. A história, baseada num caso real ocorrido no começo do século 20, acompanha a relação entre duas mulheres que desafiaram os tabus de um vilarejo na região da Galícia para ficarem juntas.
Rodado num solene preto e branco, o longa mostra como as duas protagonistas se conheceram numa escola católica e logo se apaixonaram. Para ficarem juntas, Elisa chega até a sair da cidade e voltar disfarçada de homem para conseguir se casar com Marcela. O truque, contudo, não ilude ninguém, e as duas passam a enfrentar ameaças crescentes.
O que me interessava era mostrar como essas personagens se relacionavam e descobriam o que era o sexo num ano como 1901, antes de existir qualquer referência ‘queer’”, diz a cineasta.
Um Outro Olhar
sexta-feira, 12 de abril de 2019
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Risco de solidão é maior para a comunidade de gays, lésbicas e outras minorias que envelhece
Falta de apoio de amigos e familiares é uma preocupação para os idosos gays
Relatório mundial divulgado no dia 19 de março mostra que a relação homossexual ainda é crime em 70 países, sendo que seis deles preveem pena de morte. O levantamento chama-se “Fobia de Estado” e está em sua 13ª. edição. Inclui apenas membros da ONU, entre os quais 35% criminalizam a homossexualidade – a maioria na África. É realizado pela Associação Internacional de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Trans e Intersexuais (Ilga em inglês). Segundo a organização, em 1969, 74% das pessoas viviam em nações onde ser gay era crime; atualmente, esse percentual é de 23%. Um caso emblemático é o da populosa Índia, onde a prática foi descriminalizada ano passado. Aproveito para voltar ao assunto porque, se envelhecer é um desafio para todos, pode ser bem mais difícil para os homossexuais.
Muitos desafios relacionados ao envelhecimento são comuns a todos: imaginar quem cuidará de nós se ficarmos muito frágeis ou avaliar qual será nossa reserva financeira depois da aposentadoria. Há outros que angustiam os homossexuais, como mostrou pesquisa nacional realizada no ano passado pela AARP, a Associação de Aposentados dos EUA, entidade que reúne quase 38 milhões de afiliados. De acordo com o levantamento, 57% dos homens gays acima dos 45 anos são solteiros e 46% vivem sozinhos. Entre as lésbicas, os percentuais são menores: respectivamente, 39% e 36%.
A solidão tem um enorme impacto negativo no bem-estar e, quanto mais vulnerável o círculo de relacionamentos de uma pessoa, pior. Na falta de cônjuges e filhos, essa rede de proteção diminui e mesmo o número de potenciais cuidadores é afetado, ainda mais se o indivíduo se afastou do seu núcleo familiar. A mesma pesquisa mostra que os adultos LGBTQ se preocupam de não ter apoio de amigos e familiares ao envelhecer. Um outro estudo, do Williams Institute, ligado à Universidade da Califórnia, relatou que quase 60% de idosos homossexuais se ressentem da falta de companhia e 50% se sentem isolados. Enquanto o aumento do número de centros comunitários voltados para o segmento homossexual já é uma realidade na Califórnia, no Brasil mal engatinha.
Fonte: G1, Bem Estar, por Mariza Tavares, 28/03/2019
Um Outro Olhar
quarta-feira, 10 de abril de 2019
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Populistas da Polônia escolhem os gays como seus maiores inimigos Sigla governista e líderes católicos se dizem contrários a direitos para comunidade LGBT
Quando Maciej Gosniowski estava crescendo numa cidade pequena no sul da Polônia, parte de uma família religiosa e de uma comunidade conservadora, as pessoas viviam dizendo que havia algo de errado com ele.
Seria melhor eu mudar meu jeito de ser”, ele se recorda de ouvir de seus professores. “Seria melhor se eu me comportasse mais como menino. Isso facilitaria minha vida.”
Gosniowski levava surras de outros alunos, que o xingavam usando palavrões homofóbicos que ele ainda não entendia. Ele não quer que outras crianças ou adolescentes sofram como ele sofreu, por isso saudou a decisão do prefeito de Varsóvia, no mês passado, de fazer uma declaração promovendo a tolerância.
Mas as reações contra a declaração o deixaram abalado.
O partido governista da Polônia, Lei e Justiça, aproveitou a declaração e toda a questão dos direitos dos gays na campanha que está fazendo para as eleições de representantes na União Europeia, em maio, e para as eleições nacionais, no próximo outono.
No passado o partido atacava migrantes, vendo-os como ameaça à alma do país. Mas nas últimas semanas os homossexuais viraram seu inimigo público número um.
Isso espelha uma tendência crescente na Europa central e do leste, onde partidos nacionalistas e populistas vêm cada vez mais recorrendo a questões culturais –e a ataques a gays— para mobilizar seus seguidores.
Desde a Romênia, onde o governo tentou mas não conseguiu emendar a Constituição para proibir o casamento homossexual, até a Hungria, onde homossexuais são vilipendiados e descritos como ameaça à família tradicional, a sigla LGBT vem sendo repudiada. Isso ocorre no contexto de uma luta mais ampla contra o que nacionalistas e populistas descrevem como “valores europeus”.
Jaroslaw Kaczynski, líder do partido Lei e Justiça e político mais poderoso da Polônia, usou a convenção da sigla em março para declarar que a guerra à homossexualidade é uma guerra que a Polônia precisa vencer para poder sobreviver.
Como hoje já sabemos, trata-se da sexualização das crianças desde a primeira infância”, ele disse. “Precisamos combater isso. É preciso defender a família polonesa. Precisamos defendê-la furiosamente, porque esta é uma ameaça à civilização, não apenas da Polônia mas da Europa como um todo, uma ameaça a toda a civilização baseada no cristianismo.”
O chamado mobilizou as bases do partido.
Acho que a Polônia vai se tornar uma região livre de LGBTs”, comentou Elzbieta Kruk, candidata do partido a uma cadeira no Parlamento Europeu. “Espero que sim.”
Outras organizações ecoaram os ataques, muitas vezes usando linguagem mais radical.
Durante uma partida de futebol no mês passado os torcedores de um dos clubes mais populares do país, o Legia Varsóvia, agitaram uma bandeira contendo um insulto homofóbico. Nada foi feito contra a bandeira durante o jogo. O clube disse mais tarde que não queria se envolver em “disputas políticas e ideológicas” e que a bandeira “não reflete a posição do Legia”.
Lideranças polonesas na Igreja Católica, ela própria abalada por revelações sobre abusos sexuais cometidos por clérigos, também aderiram à campanha.
O conhecido padre católico e educador Marek Dziewiecki disse a uma emissora de rádio local em entrevista recente que o sinal de “+” na sigla LGBTQ+ representa “pedófilos, zoófilos, necrófilos” e que o objetivo final é “converter as pessoas em “erotomaníacas inférteis”.
Quando 1.500 seguidores de organizações de direita radical foram a Czestochowa, o maior santuário religioso da Polônia, este mês, o reverendo Henryk Grzadko avisou as pessoas reunidas no local que a Polônia vive “uma invasão civilizacional”.
Durante sua homilia numa missa no encontro ele disse: “Eles agitam uma bandeira de arco-íris e procuram roubar nossos valores internos, como verdade, amor, vida humana, família baseada no matrimônio e moralidade fundamentada no Evangelho e nos Dez Mandamentos”.
Rafal Trzaskowski, o prefeito de Varsóvia, que divulgou a declaração de tolerância, disse que já previa uma reação cínica do governo mas acha preocupante o tipo de propaganda política produzida por emissoras públicas.
Segundo ele, foi esse mesmo tipo de material carregado de ressentimentos e ódio que levou um homem a apunhalar o prefeito de Gdansk, Pawel Adamowicz, na televisão ao vivo este ano, o matando.
Eles baseiam sua política no medo”, ele disse em entrevista dada na sede da prefeitura. “Começaram alguns anos atrás com refugiados, pintando um quadro assustador, dizendo que seríamos invadidos por centenas de milhares de migrantes que iam estuprar nossas mulheres e introduzir doenças na Polônia. Estão fazendo exatamente a mesma coisa agora.”
Mas Trzaskowski acha que não vai funcionar. Em 2015, quando o partido Lei e Justiça chegou ao poder, uma maioria avassaladora de poloneses concordou com a ideia de que era preciso fazer mais para proteger as fronteiras da Europa contra a chegada de migrantes.
Essa ameaça em grande medida já desapareceu, e a questão dos migrantes não mobiliza as pessoas como mobilizava antes, segundo sondagem de opinião divulgada na semana passada pelo Conselho Europeu de Relações Externas.
A migração ainda é importante para alguns eleitores, mas não é o único campo de batalha onde se disputarão votos antes das eleições para o Parlamento Europeu”, disse a entidade em comunicado à imprensa.
Trzaskowski, o prefeito de Varsóvia, não acredita que atacar gays seja uma arma tão eficiente quanto a campanha contra os migrantes.
A maioria da população polonesa não vai aceitar a ideia de que os homossexuais colocam nossa cultura e nossos valores em risco”, ele opinou.
Um candidato abertamente gay, Robert Biedron, formou um novo partido liberal e vem encontrando apoio amplo para sua mensagem, mesmo fora dos centros urbanos.
Uma pesquisa recente de opinião pública conduzida pela Ipsos para o site OKO.Press concluiu que 56% dos poloneses não são contra as uniões civis; dois anos atrás, eram 52%.
Ao mesmo tempo, porém, os poloneses continuam a se opor à adoção de crianças por casais gays: apenas 18% das pessoas são a favor da ideia.
Oktawiusz Chrzanowski, 36, que teve uma participação crucial na redação da declaração de Varsóvia, e seu companheiro, Hubert Sobecki, disseram que um dos elementos mais ofensivos da campanha do governo foi o esforço para retratar a homossexualidade como um perigo para as crianças.
O mais chocante e revoltante é o modo como alegam que os membros da comunidade LGBT são pedófilos”, disse Sobecki.
A declaração de Varsóvia prevê educação sexual nas escolas que siga as diretrizes da Organização Mundial de Saúde e determina a criação de um abrigo na cidade para pessoas rejeitadas e expulsas por suas famílias e comunidades.
Chrzanowski espera que algum dia no futuro não distante todas as escolas contem com a figura de um “guia”, alguém a quem os estudantes possam pedir conselhos e orientação sem o receio de serem julgados.
Gosniowski, que decidiu sair do armário depois de ser espancado no colégio e que é uma das poucas drag queens do país, disse que hoje sente-se confiante em sua sexualidade.
Num almoço recente em um café de Varsóvia, ele usou moletom cor-de rosa e brincos dourados de argola, com os cabelos loiros compridos. É uma tomada inequívoca de posição em um país onde o inconformismo ainda pode ter custo elevado.
Fonte: Folha de SP, por Marc Santora, Tradução de Clara Allain, 09/04/2019
Um Outro Olhar
segunda-feira, 8 de abril de 2019
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Mulher posa para foto com uma bandeira de arco-íris enquanto pessoas se reúnem para uma renúncia em massa à Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias em Salt Lake City, nos EUA, em 2015. — Foto: Rick Bowmer/AP
Mórmons permitirão batismo de filhos de casais LGBT
Impedimento determinado em 2015 tinha afastado 1.500 membros da congregação, segundo relatório. Mudanças foram promovidas pelo presidente da Igreja, Russell Nelson, a fim de 'reduzir o ódio e os conflitos tão comuns na atualidade'.
A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias informou nesta quinta-feira (4) nos Estados Unidos que permitirá que filhos de casais de mesmo sexo sejam batizados.
Em comunicado, a igreja anunciou esta mudança nas políticas internas envolvendo fiéis membros da comunidade LGBT, especificamente a anulação de uma medida de 2015 que impedia que filhos de casais do mesmo sexo fossem batizados e recebessem bênçãos, assim como que também não vai classificar como "apostasia" as uniões de casais homoafetivos.
Os filhos de pais que se identificam como lésbicas, gays ou outras minorias podem ser batizados sem a aprovação da Primeira Presidência se os pais com custódia derem permissão para o batismo", diz o comunicado, divulgado dois dias antes da conferência anual dos mórmons no estado de Utah, nos Estados Unidos.
O anúncio, feito por Dallin Oaks, da Primeira Presidência, explica que o novo enfoque não representa uma modificação na doutrina a respeito "do casamento ou dos mandamentos de Deus sobre castidade e moralidade". Isso significa, especificou Oaks, que espera-se que os mórmons LGBT "atuem conforme as doutrinas da Igreja".
A regra estabelecida em 2015, segundo relatórios, provocou o afastamento de 1.500 membros da comunidade LGBT da congregação.
As mudanças foram promovidas pelo presidente da Igreja, Russell Nelson, que assumiu o cargo há um ano, a fim de "reduzir o ódio e os conflitos tão comuns na atualidade".
Há algumas semanas, a Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, que é a frequentada pela maioria dos moradores de Utah, deixou de se opor à inclusão da comunidade gay em uma medida legislativa de combate aos crimes de ódio no estado, abrindo o caminho para que a iniciativa se tornasse lei.
Um Outro Olhar
sexta-feira, 5 de abril de 2019
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Prevista para estrear no próximo dia 15 de abril, a nova minissérie da Globo, “Se Eu Fechar os Olhos Agora”, vai mostrar uma sociedade conservadora da década de 60. E, entre as diversas histórias fora dos padrões na trama, um dos destaques será o relacionamento de Isabel (Débora Falabella) e Adalgisa (Mariana Ximenes)
Na história teremos uma das personagens como a primeira-dama da cidadezinha de São Miguel, no interior do Rio de Janeiro, casada com o prefeito Adriano (Murilo Benício), com quem vive um relacionamento de aparências. A outra personagem é uma mulher à frente do seu tempo, para 1960, num relacionamento moderno com Geraldo (Gabriel Braga Nunes), porém sem graça.
As personagens Isabel (Débora Falabella) e Adalgisa (Mariana Ximenes) vão viver um romance que começará às escondidas, quando ambas insatisfeitas em seus relacionamentos hétero, buscam mais liberdade e aventura em suas vidas.
Fico muito contente que ela tenha um outro romance, que é misterioso. É onde ela se sente feliz e realizada, onde ela se sente mulher”, celebra Mariana Ximenes.
Eu acho que a Isabel é uma mulher que tem a ânsia de ser feliz e de furar com aquela bolha em que ela vive. O grande barato da série é esse: mostrar a sociedade que diz que é uma coisa, se coloca de uma forma superconservadora, mas todos têm teto de vidro e algo de obscuro, de secreto, de transgressor. Cada um de um jeito”, opina Débora Falabella.
Um Outro Olhar
quarta-feira, 3 de abril de 2019
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Lori Lightfoot, prefeita eleita de Chicago vai enfrentar grandes desafios em uma das cidades mais populosas dos EUA (Joshua Lott/Reuters)
Chicago elege a primeira prefeita negra e lésbica
Lori Lightfoot enfrentará problemas como altas taxas de criminalidade, corrupção endêmica, déficits financeiros e falta de recurso
Chicago — A democrata Lori Lightfoot foi eleita na terça-feira, 3, por esmagadora maioria, como a primeira prefeita negra e lésbica de Chicago, a terceira cidade mais populosa dos Estados Unidos.
Hoje nós não apenas fizemos história, mas iniciamos um movimento de mudança”, disse a advogada de 56 anos, que comemorou sua vitória em um hotel na cidade pouco depois do Conselho Eleitoral a declarar vencedora com 73,8%.
Quando começamos nossa campanha, ninguém confiava em nossas possibilidades. Agora vejam onde chegamos”, acrescentou a prefeita eleita, que prometeu colocar “os interesses de todos os moradores da cidade acima dos interesses de alguns poderosos”.
Lori enfrentará problemas como altas taxas de criminalidade, brutalidade policial, corrupção endêmica, déficits financeiros e falta de recursos para a educação pública. A cidade de Chicago registrou 561 assassinatos em 2018, 100 a menos que no ano anterior, porém mais que Nova York e Los Angeles – as duas maiores cidades do país -, juntas.
Essas taxas de homicídio levaram o presidente americano, Donald Trump, a ameaçar em 2017 intervir na cidade com forças federais para conter o que ele chamou de “carnificina”.
Nas eleições, Lori Lightfoot derrotou a também negra Toni Preckwinkle, presidente do Partido Democrata em Illinois, que obteve 26,2% dos votos.
Esta é claramente uma noite histórica, pois até pouco tempo atrás, duas mulheres negras em um segundo turno para a prefeitura, seria algo impensável”, disse Preckwinkle.
No pleito, apenas 29% dos 1,5 milhão dos eleitores participaram, número menor que os 34% participaram do primeiro turno, em fevereiro, quando tinha 14 candidatos na disputa. Esse número foi o resultado do abalo político que levou ao anúncio em setembro do atual prefeito, Rahm Emanuel, de não tentar um terceiro mandato.
O ex-congressista e também ex-chefe do Gabinete dos presidentes Bill Clinton e Barack Obama, que chegou ao poder com as melhores credenciais, entrou em descrédito com a população após um caso de violência policial.
O escândalo ocorreu em 2014, quando um policial branco matou um adolescente negro, com 16 disparos pelas costas. Emanuel perdeu o apoio da comunidade negra depois que seus líderes o acusaram de encobrir o crime. O policial Jason Van Dyke foi condenado a 81 meses de prisão por um assassinato em segundo grau.