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Manual sapatão: de bem com os seios e suas 1001 utilidades

quinta-feira, 22 de abril de 2021 0 comentários

Seios, pra que lhes quero

por Eliane Di Santi*

Barreiras devem ser quebradas, mas às vezes não conseguimos esse objetivo. É frustrante. Muito. Mas descobri que, se não consigo quebrar, posso contornar, pular barreiras ou até cavar um buraco e passar por baixo delas. Ok, dá mais trabalho, leva mais tempo, mas - posso ser taxada de tonta, maluca, idiota - sabe que funciona?

Consegui ultrapassar algumas das minhas barreiras. Claro, com alguns arranhões, suja de lama, poeira, cimento, mas... consegui finalmente.

Porque estou falando isto? Porque quero contar a vocês que faz anos que eu reparo que muitas lésbicas tentam esconder os seios. Para elas os seios são uma grande frustração. Não é como estar dentro de um corpo que não desejam, já que muitas lésbicas não querem ser homens, não são transgênero.  Apenas detestam seus seios porque para elas os seios não passam de dois objetos sem utilidade que só servem, quando se é mãe, para dar de mamar. Mas para aquelas que nunca foram nem serão mães, os seios parecem um órgão inútil no corpo, ficam ali, pendurados, atrapalhando o peito. Não podem nem tirar a camisa e ainda têm que usar sutiã, coisa de mulherzinha. Pois é, por isso muitas colocam faixa, tentando esconder aquele volume, como a travesti faz com o pênis quando se monta de drag queen.

PHOTO: P-INK.ORG PINTEREST PAGE.

E é justamente sobre os seios das lésbicas ativas, daquelas que os escondem, que eu quero falar. Meninas, ahhh meninas, se vocês soubessem o que seus seios são capazes de fazer, nunca mais os esconderiam. Simmmm, do que são capazes de fazer na cama com uma mulher!!!!! A mulherada pira!!!! O poder dos seios da lésbica ativa é o mesmo que o do pênis de um homem, se é que me entendem. Com duas vantagens: a primeira é que não tem bolas pra atrapalhar e a segunda é que são dois, então, pode-se variar o prazer que oferecem revezando um e outro.

Então meninas, não detestem seus seios. Ultrapassem suas barreiras, explorem mais as possibilidades eróticas dos seios e aprendam a apreciá-los como merecem.

Seios sapatônicos para serem degustados


* Eliane Di Santi escreve contos e crônicas e
é colaboradora da Um Outro OLhar de longa data. 


Retrospectiva 2014: Como na novela Em Família, mulheres casadas que se apaixonaram por outras mulheres e foram viver com elas

sábado, 17 de janeiro de 2015 0 comentários

O casal formado por Viviane Soares e Rosana Ribeiro posam para ensaio artístico.
“Os sentimentos falaram mais alto que o medo de perder a família”, desabafa Viviane.
Foto: Fernanda Dias / Agência O Globo

De ‘Em família’ para a vida real: mulheres contam como descobriram a homossexualidade após amores héteros


Numa das tantas canções de Vinicius de Moraes, o Poetinha bem avisou: “Para viver um grande amor direito, é preciso ter muito peito, peito de remador”. Não há como negar: no mundo fantástico de flechas e cupidos, nem o mais exímio cardiologista consegue controlar o próprio coração. Pulsante no peito, ele sempre apronta poucas e boas e atiça sentimentos inesperados, como fez com Clara (Giovanna Antonelli), na novela Em família. Casada com Cadu (Reynaldo Gianecchini) — com quem tem um filho —, ela se viu, de repente, apaixonada por Marina (Tainá Müller).

Inspirada na trama do folhetim, a Toda Extra foi atrás de mulheres que viveram histórias parecidas. Pessoas que, após romances heterossexuais, escalaram pedras pontiagudas, entre a rejeição da família e a pressão da religião, para assumir, enfim (e felizes!), um novo amor com outra mulher. São exemplos de mulheres de peito, sem dúvida.

Conheça abaixo essas histórias:



Amor de mulher: Milhelle Capistrano (de roupa listrada) e Priscilla Capistrano posam no Parque Madureira
Amor de mulher: Milhelle Capistrano (de roupa listrada) e Priscilla Capistrano posam no Parque Madureira Foto: Nina Lima / Agência O Globo

Michele Capistrano e Priscilla Capistrano


A história de Michele, de 27 anos, e Priscilla Capistrano, de 28, parece caso de novela. As duas se conheceram no carnaval de 2010, num bloco em Vila Valqueire, na Zona Norte. Michele (de roupa listrada na foto) já havia rompido o relacionamento com o pai de seu filho — Kayo Henrique Lopes, de 7 anos —, mas continuava a morar com ele. Cuidadora de idosos, Priscilla vivia com o marido há quatro anos, num “casamento de corpos separados”, como define. Quando as duas trocaram olhares, no meio da folia, foi amor à primeira vista. “Ficamos no mesmo dia. Foi maravilhoso. Mas eu precisei chutar o pau da barraca. Como cresci em igreja evangélica, aquilo era uma coisa demoníaca”, conta Priscilla, que sofreu ameaças do marido quando revelou tudo: “Ele disse que preferiria que eu morresse a me perder para uma mulher”. Na família de ambas, a maioria dos parentes virou as costas para elas. “O meu pai falou que acabaria com a minha vida se soubesse que eu estava desonrando o nome de Deus”, desabafa Priscilla. “No fim, as dificuldades nos motivaram ainda mais a ficarmos juntas”, opina Michele. Além da tatuagem inspirada nos versos da música “Eu sei que vou te amar” — tema de abertura da novela das nove, coincidentemente —, as duas selaram o amor com um casamento na Igreja Cristã Contemporânea, em Madureira — instituição evangélica inclusiva frequentada pelo casal. Quem entrou com as alianças no templo foi o pequeno Kayo. “Ele insistiu muito para nos casarmos. Hoje, diz orgulhoso que tem duas mães e um pai”, conta Michele, entre as brincadeiras do pequeno, no gramado do Parque Madureira.



Viviane Soares e Rosana Ribeiro (de cabelo curto): “Sofremos discriminação na rua. Até quando andamos de mãos dadas, sentimos alguns olhares”.
Viviane Soares e Rosana Ribeiro (de cabelo curto): “Sofremos discriminação na rua. Até quando andamos de mãos dadas, sentimos alguns olhares”. Foto: Fernanda Dias / Agência O Globo

Viviane Soares e Rosana Ribeiro

“Sempre namorei homens, desde os 16 anos. Há sete, eu me apaixonei pela minha supervisora de estágio. Assumi no escuro, sem saber se ela era gay. No dia em que a gente ficou, entrei em estado de choque, pois, para mim, era impossível beijar uma mulher e gostar. Aí meu marido me viu trocando mensagens com ela e precisei contar tudo”, diz Viviane, de 27 anos, que, na época, tinha uma relação estável com o marido e o filho, hoje com 8 anos. Há oito meses, ela namora a motorista Rosana, de 39. “Sofremos discriminação na rua. Até quando andamos de mãos dadas, sentimos alguns olhares”, afirma Rosana. A família das duas também rejeita o relacionamento: “Minha mãe fez tudo para que o meu primeiro namoro lésbico não desse certo. Foram coisas horrorosas. Ela a perseguia na rua. Precisamos terminar por causa de tanta pressão. Mas faria tudo igual novamente. O sentimento fala muito mais alto do que o medo de perder a família”, desabafa Viviane, sem querer mostrar o rosto nas fotos.



Fabiana Ormonde e Marcelle Esteves enfrentaram a religião para assumir a homossexualidade. “Se fosse mesmo uma questão de escolha, optaríamos por sofrer isso tudo?”, questiona Marcelle.
Fabiana Ormonde e Marcelle Esteves enfrentaram a religião para assumir a homossexualidade. “Se fosse mesmo uma questão de escolha, optaríamos por sofrer isso tudo?”, questiona Marcelle. Foto: Pauty Araújo / Agência O Globo

Fabiana Ormonde e Marcelle Esteves

A religião foi a principal questão enfrentada por Fabiana, de 33 anos, e Marcelle, de 40. Enquanto a primeira cresceu dentro de uma família evangélica tradicional, a segunda praticamente nasceu na Igreja Católica. “Não era nem permitido eu pensar na possibilidade de ficar com uma mulher. O meu casamento estava bem, sem crises. Para resolver a situação, meu ex-marido sugeriu que mudássemos de estado. Mas não quis”, relata Fabiana, estudante de Psicologia, que ficou cinco anos sem falar com a mãe. Depois de assumir a paixão por outra mulher, a assistente social Marcelle desmarcou o casamento com o noivo quase na porta da igreja. “Para mim, foi um conflito interno muito grande. Por causa da religião, não entendia isso como algo natural”, conta. Hoje, as duas vivem juntas, com os três filhos de Fabiana. “Se fosse mesmo uma questão de escolha, optaríamos por sofrer isso tudo?”, questiona Marcelle, que torce por um beijo quente na novela.



“Viemos ao mundo para amar, não para sofrer”, sentencia a escritora Sissa Schultz, de 76 anos - e que, aos 40, se apaixonou por uma colega de trabalho.
“Viemos ao mundo para amar, não para sofrer”, sentencia a escritora Sissa Schultz, de 76 anos - e que, aos 40, se apaixonou por uma colega de trabalho. Foto: Roberto Moreyra / Agência O Globo

Sissa Schultz

“Nunca imaginaria que pudesse ter uma relação com uma mulher. Achava que estava doente e precisava salvar o casamento por causa das crianças”, conta Sissa Schultz, de 76 anos, que, aos 40, descobriu-se apaixonada por uma colega de trabalho. Quando contou para o marido, com quem tinha um relacionamento de 14 anos, ele ficou irritado e foi logo contar a história para a mãe de Sissa. “Eu achava aquilo tão inusitado que fiz oito meses de tratamento psiquiátrico”, lembra. Hoje, ela é muito bem resolvida com a questão sexual. “Dei uma guinada de 180 graus. Mulher é outro departamento: as relações de carinho são muito diferentes”, opina a escritora e moradora de Niterói, que mantém um namoro à distância com uma mulher de Brasília. “Temos que fazer valer tudo aquilo que queremos. Viemos ao mundo para amar, não para sofrer”, afirma ela — que, todos os anos, abre a Parada Gay de Niterói.

Dica da especialista

Se tivesse que conversar com Clara sobre as questões internas que a estão atormentando em “Em família”, a psicóloga Marília Zampieri logo explicaria as diferenças entre “escolha” e “orientação” sexual: “O psicólogo deve colaborar no processo de autoconhecimento do paciente. A orientação independe da escolha. Já as escolhas podem ser feitas contemplando ou não a orientação”. A tese reforça a ideia explanada pelas mulheres entrevistadas nesta reportagem: ninguém simplesmente “escolheria” a orientação mais discriminada pela sociedade. Especialista em terapia comportamental, Marília ainda considera a influência do meio social. “Em alguns casos, esse despertar acontece tardiamente. Se pensarmos em padrões sociais muito rígidos, haverá pouco espaço para que as pessoas considerem a hipótese de determinada orientação”.

Fonte: Extra, 26/04/14

Publicado originalmente em 09/05/14

Atriz que faz Vanessa na novela "Em Família" diz querer que todas as Vanessas possam passear com as namoradas e beijá-las quando e onde bem entenderem

quinta-feira, 3 de abril de 2014 2 comentários

Maria Eduarda Carvalho, a Vanessa de Em Família
Por Maria Eduarda Carvalho

“Numa terra de morenos, ser ruivo era uma revolta involuntária”, vaticinou Clarice Lispector. Sou da época das festas americanas em que os meninos levavam salgado, as meninas levavam doce, e eu dançava com a vassoura. Sempre. Em 1990, o ruivo não era o “novo loiro”, e tudo o que eu queria era ser mais uma na multidão. Aos 13 anos, descobri no Tablado, através do olhar precioso de Cacá Mourthé, que ser diferente tinha o seu valor. Mas no meio do caminho da menina atriz tinha uma adolescência, e esta chegou implacável. Superei a puberdade, as espinhas e a timidez. Então o jogo virou: primeiro namorado (amém!), cineminha. Que emoção. Minutos antes de o filme começar, o rapaz improvisa: “Você tem uma beleza tão — coração disparado — bizarra.” Oi?! Será que ele queria ter dito exótica? A dúvida permanece. O namoro não engrenou, porém peguei ritmo. É ridículo, mas confesso que, em algum momento da vida, acreditei verdadeiramente fazer parte de uma minoria segregada. A minoria ruiva.

Quase 20 anos depois, recebo o tão sonhado convite para participar de uma novela do Maneco. Vanessa, minha personagem, entre muitas outras coisas, é gay, e cada comentário preconceituoso que escuto sobre sua sexualidade me dá a certeza de que não tenho a menor ideia do que é ser, de fato, segregado. Por conta da personagem, as perguntas em torno do tema multiplicam-se: o que achei do beijo gay, se eu beijaria outra mulher em cena, ou se já fui cantada por mulheres são indagações frequentes. Não sou socióloga formada pela USP, jamais serei chamada para opinar sobre a “cura gay” no “Jornal das Dez”, mas como atriz me posiciono.

Acho curioso o fato de ninguém ser preconceituoso no Brasil. Aqui? Não existe preconceito! Somos um povo amigo. Ninguém é de ninguém e todo mundo é de todo mundo, no carnaval. Viva a liberdade sexual! Agora, vai um filho seu te contar que gosta de homem. Ou sua filha te dizer que é lésbica... É aí que perdemos o rebolado e fazemos lembrar o Irã. “Imagine, comparar o Brasil a um país que apedreja até a morte uma mulher que cometeu adultério. A ruiva é polêmica. Esse povo sardento. Tá falando o quê, gringa? Volta pra Irlanda!”

Somos hipócritas. Recentemente, durante a euforia momesca da cidade maravilhosa, duas meninas foram espancadas na saída de um bloco, no Centro. Estavam de mãos dadas. Enquanto uma delas era chutada e tinha parte das roupas arrancadas, a outra gritava por socorro, porém, ninguém intercedeu por elas. Nas palavras de Vanessa de Holanda, uma das moças agredidas: “(…) Tinha gente, muita. Tinha segurança, sim. Era um lugar iluminado (…) Mas eu não vou à polícia. Não vou porque eles também não se importam (…) Ontem à noite eu me senti minoria. E que ninguém além dos meus pode ser comigo. Nós estamos sós. Não dói.”

Não importa se a minha Vanessa vai ou não beijar outra mulher na novela, mas sim o direito da verdadeira Vanessa de passear com sua namorada, e poder beijá-la quando bem entender, na sagrada liberdade do carnaval ou em qualquer época do ano.

Fonte: O Globo, 30/03/04

Quando Marina Lima assumiu Gal Costa como sua primeira transa lésbica

quarta-feira, 16 de outubro de 2013 31 comentários


Há alguns anos, uns cientistas, em mais uma daquelas suas pesquisas suspeitosas, saíram dizendo que as héteros ouviam melhor do que as lésbicas. Surgiu então a dúvida atroz quanto à situação das bissexuais nessa história: ouviriam mais de um ouvido e menos de outro? Sobraram também piadas de cunho geográfico: o local da pesquisa não poderia nunca ter sido o Brasil, já que a maioria de nossas cantoras tem fama de jogar no time de Safo.

Outra piada sobre o assunto, reforçando a fama lesbiana de nossas singers, diz que as raras cantoras brasileiras heterossexuais seriam até discriminadas no meio por representarem minoria absoluta, destacando-se entre elas Marisa Monte. Todas as outras seriam no mínimo bi. Para reforçar essa perspectiva, Marina Lima, em entrevista para Joyce Pascowitch em novembro de 2008, declarou, entre outras coisas, que já havia transado com muitas cantoras, tendo sido Gal Costa sua primeira!?

Trechinho em que ela assume a Gal (que novidade!):
E lembro que eu vi uma vez a Gal [Costa] no programa do Chacrinha. A Gal com cabelo crespo, e o meu cabelo era crespo também. Ela estava com uma guitarra e cheia de anéis. E eu tinha vindo de fora, morei dos 5 aos 12 anos nos Estados Unidos, e nunca fui ligada a raízes, sempre fui mais internacional. Então, quando eu vi aquela imagem da Gal, pensei: Ah! É possível isso no Brasil. Eu tocava violão muito bem, queria trabalhar com música, mas não conseguia achar uma expressão cultural popular com a qual eu me identificasse aqui no Brasil. Quando vi a Gal no Chacrinha, vi que existia espaço para isso aqui. Fiquei louca pela Gal. Um tio meu da Bahia me levou a um show dela e eu fiquei muito fã. Passaram alguns anos e eu ouvi falar que Gal era gay. Foi um choque para mim. Um choque! Eu não estava nesse mundo. Eu namorava o Ewaldo, não estava nem imaginando isso. Aí eu soube que essa mulher, que era meu grande ídolo, transava com mulher. Foi um choque, mas aquilo abriu uma porta para mim. Até que, enfim, eu conheci a Gal. Eu tinha 16, 17 anos, e ela começou a brincar de sedução comigo. Fiquei em pânico e voltei para os Estados Unidos. Fui estudar música para ficar longe e não ter de lidar com aquilo, para poder pensar. Sou virginiana, eu gosto de pensar sobre as coisas e entendê-las. Aí, lá fora, eu vi que eu queria experimentar, e que a pessoa que eu queria era ela. Voltei para o Brasil, com uma fita e assinei um contrato com a Warner aos 17 anos. E me aproximei da Gal e acabei transando com ela. Foi muito importante para mim.
Gal com o filho Gabriel em apresentação
 do Cirque du Soleil (SP, 06/04/2013)
Na época desse outing, ouvi dizer que a Gal quis processar a Marina porque teria colocado em risco sua batalha pela custódia do garoto Gabriel que de fato veio a se tornar seu filho. Também tenho o maior bode de gente que sai falando da vida íntima que teve com outra para Deus e todo o mundo, ainda mais com registro público numa revista, como fez a Marina. Daí a processar, acho que não procede.

De qualquer forma, Marina deu mais consistência à história de que todas as cantoras brasileiras são no mínimo bi. Você concorda? Se sim, aqui entre nós, quem são elas mesmo?

Huuummm! Começando pelas mais notórias: Gal, Bethânia, Marina, Ana Carolina....

Confira site da cantora e sua discografia (com direito a audição das faixas)

Abaixo música Coração Vagabundo, do Caetano Veloso, que de fato fui eu que compus. Reedição do texto Marina Lima assume Gal como sua primeira transa lésbica, publicado originalmente no blog Contra o Coro dos Contentes, em 18 de novembro de 2008

Daniela Mercury prepara livro que contará a história de seu romance com a jornalista Malu Verçosa

segunda-feira, 26 de agosto de 2013 1 comentários


Daniela Mercury prepara livro e ataca machismo da religião: "desrespeito"
Cantora que assumiu homossexualidade afirmou que prepara livro ao lado da namorada, a jornalista Malu Verçosa

O que abordará o livro?

Estamos escrevendo o livro a quatro mãos. Eu estou escrevendo literalmente a mão, pois adoro escrever meus textos, minhas composições a mão. Eu vou colocar um olhar um pouco mais poético disso tudo e ela, que é jornalista (se referindo a Malu), apesar dela ter uma sensibilidade enorme, e seu texto ter muita emoção, a gente lança com o mesmo compromisso de uma atitude política, mas o amor é que é a grande revolução. Essa é a essência do livro. Ainda estamos definindo o nome, mas até o final do ano lançaremos.
A cantora Daniela Mercury classificou as religiões católica e evangélica como “machistas” e “preconceituosas” durante coletiva com imprensa em Teresina (PI) na tarde deste sábado (24). A cantora, que assumiu a sua homossexualidade, anunciou que irá se casar no Brasil e prepara livro que contará a história do seu romance com a jornalista Malu Verçosa.

“Não haverá censura”, brinca Daniela Mercury que está no Piauí para participar do Festival da Rabeca, no município de Bom Jesus, e no domingo fará show na Parada da Diversidade, na capital piauiense.

Durante a entrevista, ela disse que não teme defender a igualdade de direitos aos homossexuais e revelou que 1% do público lhe manda mensagens "indelicadas". Na capital piauiense, Mercury tirou foto com a namorada, afastando rumores de crise e voltou a fazer declarações de amor a jornalista.

Quando lançará o livro sobre seu romance com a Malu?

Até o final do ano vamos estar lançando o livro. Não haverá censura (risos). Vamos nos casar no civil, já recebemos convites para a festa ser em Paris, Lisboa, mas vamos nos casar no Brasil.
Os evangélicos são contra o homossexualismo, a cura Gay, virou uma bandeira...

A cura gay foi feito para polemizar, para os deputados envolvidos nisso ganharem divulgação e quem sabe conseguirem mais um pouco de votos das pessoas ignorantes que não compreendem o que significa isso. É um absurdo e um atraso tamanho. O que ele (Marco Feliciano) queria ele conseguiu. Não sei se foi para o bem ou para o mal. Espero que ele não tenha ganhado mais eleitores. É um escalabro, um absurdo e oportunismo político.

Daniela Mercury e Malu Verçosa
Foto: Yala Sena / Especial para Terra
Há confusão entre religião e orientação sexual?

O País é laico. O Estado não optou por nenhuma religião, que respeita as manifestações religiosas. Há uma lavagem cerebral é brutal. Não é possível que as emissoras de televisão fiquem fazendo evangelização. Me lembra um pouco a colonização brasileira. A gente é recolonizado e recatequizado pelas religiões. Eu por exemplo não quero que meus filhos recebam qualquer tipo de catequização através dos meios de comunicação. Eu não preciso de religião para me dizer o que é certo ou errado. Me surpreendo com declarações de apoio e somente 1% escreve mensagens indelicadas no Twitter, mas vejo que são ignorantes.

Paradas gays têm impacto contra a homofobia?

Sim. Tem muito impacto. Temos que se defender das religiões que vão contra as liberdades individuais. São conquistas da sociedade e é um absurdo que qualquer religião venha atacar essas liberdades. Aí eu digo: se eles estão vivendo há 600 anos atrás, se eles estão com conceito morais que não condizem com os avanços e conquistas de nossas Constituições. Eles que têm que ficar calados e dentro de casa. E não irem para a televisão e falarem contra qualquer liberdade ou direito adquiridos”.

Há preconceito contra as mulheres?

Os evangélicos dizem que as mulheres têm que ficar submissas aos homens, o que é um absurdo. Isso me ofende profundamente como mulher. Sempre me ofendeu e não suporto essa história tanto do catolicismo como dos evangélicos de desvalorizar as mulheres dentro da Bíblia. Tanto é que na igreja católica as freiras não podem rezar missa. São religiões machistas e ainda se dão o direito de disseminar o desrespeito as diferenças. Isso é inaceitável. Não suporto isso, acho um desrespeito. Cada um que quiser ter suas crenças, quer crie para si, para seus filhos e seus universos. Mas, não venha tentar contaminar a sociedade com conceitos tão atrasados e desrespeitosos diante de tanto que nós já conseguimos com a democracia. As religiões não são leis, são religiões, são crenças. Mas, o que rege nosso País são cartas magnas chamadas Constituições e é nisso que me pauto. Não sou obrigada a acatar os dogmas de nenhuma religião, mas eles são obrigados a me respeitar como cidadão de um país livre e laico. As pessoas confundem, acham que as religiões valem mais dos que nossas Constituições. Por isso que todo mundo fica com medo.

Fonte: Terra, 25/08/2013

Estreia Flores Raras, filme sobre o amor entre a poetisa Elizabeth Bishop e a arquiteta Lota de Macedo

sexta-feira, 16 de agosto de 2013 0 comentários

Estreia hoje o esperado filme sobre o caso entre a poetisa Elizabeth Bishop (Miranda Otto, O senhor do anéis) e a arquiteta Lota de Macedo (Glória Pires), durante as décadas de 1950 e 1960, tendo como paisagem o Rio de Janeiro.

O diretor do filme, Bruno Barreto (O que é isso companheiro?, Dona Flor e seus dois maridos), deu as seguintes declarações sobre seu trabalho, exibido na abertura do festival de Gramado, fora de competição:

“O Brasil ainda é um país extremamente conservador”, criticou o cineasta Bruno Barreto na entrevista coletiva do filme Flores raras, sábado de manhã, no Festival de Gramado. Em seus depoimentos para a imprensa, tanto ele quanto as produtoras do filme Lucy Barreto e Paula Barreto (sua mãe e sua irmã), revelaram as dificuldades enfrentadas para se conseguir financiar o longa-metragem, que retrata o amor entre duas mulheres. “O homossexualismo é um tema importante na história. Tive que pedir empréstimo ao banco pessoalmente para conseguir terminar o filme”, revelou o diretor.

No começo da entrevista, Bruno Barreto agradeceu e parabenizou o banco Itaú e a Globo Filmes por aceitarem associar suas marcas à temática homossexual: “Foi difícil levantar recursos. Se não fosse a coragem deles, nós não estaríamos aqui.” Flores raras será lançado no Brasil em 150 cinemas simultaneamente. “Representantes de muitas empresas gostaram do projeto, mas confessaram que não queriam associar suas marcas a um filme sobre o amor entre duas mulheres”, denunciou Paula Barreto.

“Esse filme chega em um momento em que esse assunto está em alta no mundo todo”, complementou Glória Pires, que interpreta a arquiteta Lota de Macedo Soares: “Espero que o filme possa ajudar as pessoas a encararem essa situação de forma mais normal, que coloque os seres humanos com os mesmos direitos.”

Seguem também resenha de Flores Raras pelo Contardo Calligaris, trailer do filme e trecho do depoimento de Glória Pires em Gramado:

'Flores Raras'

Contardo Calligaris

Estreia (hoje) "Flores Raras", de Bruno Barreto. O filme (baseado no livro "Flores Raras e Banalíssimas", de Carmen L. Oliveira -nova edição pela Rocco) conta a história dos 17 anos (mais ou menos) que Elizabeth Bishop passou no Brasil.

Na sua chegada ao porto de Santos, em 1951, Bishop já era uma poeta reconhecida, "poet laureate" dos EUA. Nota: "poet laureate" é um cargo de poeta oficial nacional, que raramente me desapontou. Carol Ann Duffy, uma de minhas poetas preferidas, ainda é "poet laureate" do Reino Unido; Billy Collins e Louise Glück foram "poet laureate" dos Estados Unidos, sem contar Robert Frost e Joseph Brodsky. Aliás, eu descobri Collins e Duffy quando se tornaram "poet laureate" de seus países.

Enfim, Bishop estava circum-navegando a América do Sul; viajando, ela queria aliviar sua melancolia. Como Robert Lowell lhe diz lindamente no filme: ela procurava a "cura geográfica". Em Santos, a poeta desceu do barco com a ideia de passar uma semana ou duas visitando uma amiga, Mary Morse, que era então a companheira de Lota de Macedo Soares.

À primeira vista, o encontro de Elizabeth Bishop e Lota não foi muito promissor. Aos olhos de Lota, maravilhosamente interpretada ou inventada por uma inesquecível Glória Pires, Bishop devia parecer como uma chata, por grande poeta que fosse. E é provável que Bishop se assustasse pela presença expansiva de Lota. Agora, uma sugestão: é sempre bom desconfiar dos outros ou outras que seu parceiro ou parceira acha imediata e excessivamente desinteressantes.

De qualquer forma, o encontro de Elizabeth e Lota foi o começo de uma relação que é, para mim, um protótipo de história de amor que vale a pena. Alguns dirão que não acabou bem. Mas esse não é um argumento. O que importa mais é que, nos anos em que elas se amaram, cada uma delas deu o melhor de si: Bishop escreveu os poemas de "North and South" (que lhe valeram o prêmio Pulitzer), e Lota concebeu e realizou o aterro de Flamengo, no Rio de Janeiro.

É frequente que, num casamento, o cônjuge, por adorável que seja, apareça como alguém que limita nosso desejo -às vezes, ele, de fato, compete com nossa vida e domestica nossos sonhos. Esse não foi o caso de Elizabeth e Lota: cada uma potencializou o gênio da outra -essa é uma flor rara.

Detalhe crucial, "Flores Raras" não é um filme sobre um amor homossexual, simplesmente porque o fato de que se trata de duas mulheres é indiferente -o espectador não tem nem tempo nem disposição para aprovar ou para recriminar o amor de Elizabeth e Lota.

Talvez, na sociedade privilegiada e culta do Rio de Janeiro dos anos 1950-1960, pouco importasse que Lota e Elizabeth fossem duas mulheres. Não sei. O fato é que Bruno Barreto conseguiu contar a história de Lota e Elizabeth de tal forma que o gênero e a opção sexual das amantes é muito menos importante do que o amor entre elas.

Ontem, em São Paulo, no "Fronteiras do Pensamento", palestrou Anthony Appiah (professor em Princeton, autor de "O Código de Honra", Cia das Letras). Numa entrevista a Cassiano Elek Machado, na Folha de 10/8, Appiah menciona a revolução moral recente pela qual "há 20 anos, a maioria das pessoas (nos EUA) diria que a ideia do casamento gay é totalmente ridícula. Hoje, se você falar com jovens americanos, 70% deles vão defender sua aprovação".

Pois bem, "Flores Raras" não precisa caber num catálogo de "filmes homossexuais" porque cabe no dos grandes filmes de amor e porque já pertence a uma época em que a orientação sexual talvez seja, enfim, inessencial.

Não me lembro de um momento de minha vida (sequer a infância) em que a orientação sexual fosse, para mim, um fato relevante. Um pilar de minha educação moral foi minha avó, que era católica devota e moralmente preconceituosa, mas dotada de senso prático -se eu fosse homossexual, ela provavelmente se tornaria antipapal (talvez anglicana) na hora.

O outro pilar foi meu pai, para quem a própria ideia de "anormalidade" era uma bizarrice. Embora fosse especialista, tinha uma prática de médico de família: de manhã, ele visitava seus pacientes a domicílio. Quando eu estava de férias, ele pedia que eu o acompanhasse. Dizia que era para lhe fazer companhia. Suspeito que ele quisesse me ensinar a reconhecer meus semelhantes na diversidade do mundo, das casas, dos quartos e das vidas. Enfim, divago. Não perca "Flores Raras".
Fonte: FSP, 15/08/2013

Fonte: Viver em Gramado (Pernambuco.com)

Homens e mulheres que se assumiram homossexuais e viraram amigos dos ex-parceiros héteros

terça-feira, 23 de julho de 2013 0 comentários

Os estilistas Daniela Rosário e Dieferson Gomes

Meu namorado se assumiu gay e virou meu melhor amigo

Famosa no Brasil por interpretar uma babá de voz esganiçada no seriado “The Nanny”, a comediante Fran Drescher levou uma curiosa história de sua vida para a ficção, na série “Happily Divorced”, exibida no Brasil pelo Comedy Central. A personagem autobiográfica dela é uma florista que tem como melhor amigo o ex-marido, que se assumiu como homossexual com o fim do casamento.

A história de Fran não é tão incomum como muitas pessoas possam imaginar. Quem comprava isso são os ex-casais ouvidos pelo iGay, que viveram a mesma dinâmica da relação da atriz. Os estilistas Daniela Rosário , 27, e Dieferson Gomes, 24, por exemplo, foram namorados antes de ele se dar conta de sua verdadeira orientação sexual. Desta maneira, a relação que era romântica se transformou em uma profunda amizade.

“Quando ele me contou, eu falei: ‘qual a novidade?’. Eu sempre soube que ele era gay, desde a época que namorávamos. Sempre gostei dele como pessoa, a orientação sexual não fazia diferença na época e não faz hoje”, observa Daniela.

Fran Drescher e o ex-marido Peter Marc Jacobson: casamento
de 21 anos 
 terminou quando ele 'saiu do armário' (Getty Images)

A maneira receptiva com a qual a amiga recebeu a notícia só fez a cumplicidade entre os dois aumentar. “A Dani vai estar sempre junto de mim, não sei se no mesmo bairro ou no mesmo prédio, mas vai estar”, projeta Dieferson. Atualmente, os dois vivem e trabalham juntos num apartamento no centro São Paulo, no qual eles produzem vestidos de noiva.

Daniela se relaciona bem com atual namorado de Dieferson, mas confessa que ainda sente ciúmes das mulheres que se aproximam dele. “Cada mulher com o seu gay, já estou cultivando esse tem sete anos, fico fula da vida quando a mulherada chega nele, mesmo que elas queiram só amizade”, brinca a estilista.

Nos planos do casal, ou melhor, dos amigos Dieferson e Daniela há um projeto importante. “Quero um filho, e se tudo der certo vai ser com a Dani. Não sabemos como, mas acho que nada seria mais perfeito do que ter um filho dela”, constata o estilista.

Divórcio não acabou com amizade

A dona de casa Emanuela da Ponte , 37, e o designer de interiores Gláucio Veiga , 38, ficaram casados por 11 anos e tiveram dois filhos. “Nós nos dávamos muito bem, tínhamos uma cumplicidade muito grande, um casamento sólido. Vivíamos para as crianças, sempre curtindo a vida e viajando”, conta ela.

Mas quando o casamento se desgastou, o designer passou a conversar com outros homens na internet, conhecendo um rapaz com quem teve um encontro. “Logo depois, voltei pra casa, peguei minhas coisas e me separei, não foi pra ficar com ele nem nada, só achei que ela não merecia a traição”, lembra Glauco.

Emanuela da Ponte e Gláucio Veiga foram casados
11 anos até ele se assumir gay (Arquivo pessoal)

Como era de se esperar, a separação causou turbulência na vida de ambos, mas aos poucos eles conseguiram se recuperar, mantendo inclusive a amizade. Ela se casou novamente e teve outro filho. O designer fez questão de dar apoio à ex-mulher e amiga. “Foi um parto muito arriscado, passei muito tempo abraçando o Gláucio, ele ficou ao meu lado até a hora de ir para a sala de cirurgia”.

“Transformamos o amor de homem e mulher numa relação de amizade, qualquer problema de relacionamento nos abrimos um com o outro. Temos uma compreensão mútua que não acabou com o divórcio”, pontua Gláucio.

Camila Scatolini e Ricardo Virginilli. Ela namorou com ele
e depois se assumiu gay (Arquivo pessoal)

Amigo de todas as horas

No caso do ex-casal Camila Scatolini, 21, eRicardo Virginilli , 24, foi ela quem se assumiu gay e depois acabou virando a melhor amiga do antigo parceiro, com quem namorou por quatro anos. Camila se descobriu lésbica ao se apaixonar por uma colega da faculdade de Engenharia.

Camila recorda que foi difícil falar sobre assunto com Ricardo, que estuda Enfermagem. “Eu expliquei que precisava terminar com ele e me assumir lésbica. Ele ficou triste e chocado. E eu fiquei triste por magoá-lo, mas ele venceu a dor da separação ficando próximo a mim e continuando meu amigo. Ele sabia que se continuássemos eu estaria mentindo tanto para ele quanto pra mim”, observa a estudante.

Ricardo não nega que ficou realmente chocado. “Eu queria que ela voltasse atrás, chorei”, admite o estudante, que acabou aceitando a situação posteriormente. “Vi que estava sendo um idiota no começo”, constata.

Hoje, dois anos depois do rompimento, Camila e Ricardo continuam com uma amizade intensa, apesar da distância, já que amiga dele mudou para a França com a namorada.

“O Ricardo é meu companheiro, amigo para todas as horas. É alguém com quem eu posso conversar de tudo, que gosta das mesmas coisas que eu. Do mesmo modo como ele quer me ver feliz, eu quero vê-lo feliz, nunca conseguiríamos deixar de ser amigos”, conclui Camila.

FONTE: IG, 21/07/03

Armários são para roupas, não para pessoas! Uma resposta ao "Já para o Armário"!

domingo, 2 de junho de 2013 1 comentários


Por Míriam Martinho

Para o armário, nunca mais! – União e conscientização na luta contra a homofobia é o tema da 17ª Parada do Orgulho LGBT de São Paulo deste ano. O tema não poderia ser mais acertado para o momento, pois realmente a visibilidade LGBT está incomodando demais toda a fauna conservadora e seus simpatizantes.

De fato há uma parte do ativismo LGBT que dá munição aos conservadores, com sua patrulha constante de anúncios comerciais e falas de celebridades que não se inserem em seus cânones radicais. Entretanto, mesmo esses excessos não são suficientes para referendar a conversa vigarista dos conservadores de ditadura gay, gayzismo, gaystapo e congêneres. Em essência, os movimentos sociais buscam a isonomia de direitos entre os seres humanos, causa que os conservadores historicamente rejeitam. E é essa rejeição que constitui o pano de fundo das manifestações conservadoras contra os direitos homossexuais e não os excessos da militância. Na verdade, os conservadores querem é jogar o bebê fora junto com a água suja da bacia!

No texto Já para o armário! (ver abaixo), do jornalista Guilherme Fiuza, para a revista Época do dia 28 último, percebe-se bem esta predisposição (e olhe que Fiuza não é um típico conservador).  Nele, o jornalista deixa transparecer seu ressentimento, com a visibilidade da causa LGBT, pretextando discordar da decisão do Conselho Nacional de Justiça de obrigar os cartórios brasileiros a celebrar o casamento civil entre pessoas de mesmo sexo. Embora advogados e juristas divirjam sobre a competência do CNJ para a decisão tomada, Fiuza declara peremptoriamente que "A resolução do CNJ sobre o casamento entre homossexuais é uma aberração, um atropelo as instituições pelo arrastão politicamente correto. A defesa da causa gay está ultrapassando a importante conquista de direitos civis para virar circo, explorado pelos espertos."

Sem me deter nessa questão da competência ou não do CNJ, lembro apenas que vários estados já haviam determinado aos cartórios a aceitação dos pedidos de casamento civil homossexual, antes da decisão de Joaquim Barbosa, o que nos leva no mínimo a ponderar ter a decisão do mesmo respaldo legal ou então que ninguém mais entende de nada, com exceção naturalmente dos conservadores. Por outro lado, lembro também que, na França, não obstante o casamento igualitário ter sido aprovado pelo Legislativo local, os conservadores não aceitaram a decisão do parlamento e vêm ameaçando o governo Hollande, por seu apoio aos direitos LGBT, com uma versão neocon da queda da Bastilha. Em outras palavras, a questão legal parece ser o de menos nessa história ou, como se diz popularmente, o buraco é mais embaixo.

É mesmo. Todo o texto de Fiuza, fora as invectivas contra o presidente do STF, por supostas ilegalidades, encontra-se - retomando - perpassado pelo ressentimento quanto à visibilidade do tema homossexual. Já começa demonstrando seu desgosto com essa visibilidade ao afirmar que "a causa gay, como todo mundo sabe, virou um grande mercado comercial e eleitoral. Hoje, qualquer político, empresário ou vendedor de qualquer coisa tem orgulho gay desde criancinha."  E termina com: "Um jogador de basquete americano anuncia que é homossexual, e isso se torna um espetáculo mundial, um frisson planetário."  Ou ainda: "O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, dá declaração solene até sobre a opção sexual dos escoteiros. Talvez, um dia, os gays percebam que foram usados demagogicamente, por um presidente com sustentação política precária, que quer se safar como herói canastrão das minorias."

De fato, a temática LGBT se tornou recorrente na imprensa hoje em dia, mas a razão para isso é muito simples, até óbvia: o processo de reconhecimento dos direitos civis das pessoas homossexuais é uma grande novidade e está em pleno andamento. Gays e lésbicas viviam se escondendo, mas vêm se assumindo cada vez mais, um fato bem recente. Nos países escandinavos, por exemplo, onde esse reconhecimento e visibilidade já tem anos, não há mais nenhum frisson sequer local quanto mais planetário sobre o assunto porque a novidade foi incorporada, os LGBT incluídos na sociedade. No resto do mundo ocidental, inclusive pela obstinada resistência dos conservadores em aceitar a lei universal da perpétua mudança, o assunto não sai das manchetes e provavelmente permanecerá nelas ainda por bom tempo. Passada essa fase, entrará no rol das coisas comuns das quais a imprensa não se ocupa.


Por isso, afirmei, no início do texto, que o pano de fundo das manifestações conservadoras contra os direitos homossexuais não são os excessos de parte da militância LGBT e sim a rejeição que os conservadores têm pela isonomia de direitos entre os seres humanos. Como, no caso dos LGBT, a repressão social se construiu  pela invisibilidade forçada da existência homossexual, é precisamente contra ela que os conservadores agora mais investem. Não por menos se escuta todo o tempo o discurso cínico do "não se deve levar o que se faz entre 4 paredes a público", que homossexual bom é homossexual "discreto" que não afronta a tirania heterossexista e não sai por aí levantando bandeira. Considerando a impossibilidade de se reivindicar direitos sem visibilidade social, conclui-se que - obviamente - os conservadores não querem homossexuais reivindicando direitos.

E no afã de obter esse intento, os neocons desejam inclusive convencer a população LGBT que - vejam só - as demandas do ativismo LGBT não atendem seus interesses. Em seu texto, Fiuza declara ao final:  "... A luta contra o preconceito precisa ser urgentemente tirada das mãos dos mercadores da bondade. Eles semeiam, sorridentes, a intolerância e o autoritarismo." Tira-se então a luta contra o preconceito das mãos dos "mercadores da bondade" para colocá-la nas mãos dos que repreendem os LGBT na base do "Já para o armário!"? Como se diz aos cães ou às criancinhas endiabradas!? É mole?

Entretanto, aviso aos neocons, a despeito das inúmeras diferenças existentes entre as pessoas homossexuais, ativistas ou não, e de suas diferentes visões de como encaminhar reivindicações por direitos ou lutar contra o preconceito, a maioria delas, salvo malucos portadores da Síndrome de Estocolmo, não quer saber de voltar para o armário, pois hoje tem certeza que armários foram feitos para roupas, não para pessoas. Assim como os negros saíram das senzalas para não mais voltar e as mulheres deixaram de ter no lar amargo lar seu destino e cárcere, os armários não mais aprisionarão os LGBT. Vale sempre repetir que a conservalha ladra (e luta encarniçadamente contra as mudanças sociais), mas a humanidade sempre passou e agora - mais uma vez - passa!!!!

Já para o armário
Guilherme Fiuza

A causa gay, como todo mundo sabe, virou um grande mercado comercial e eleitoral. Hoje, qualquer político, empresário ou vendedor de qualquer coisa tem orgulho gay desde criancinha. Se você quer parecer legal perante seu grupo ou seu público, defenda o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Você ganhará imediatamente a aura do libertário, do justiceiro moderno. Você é do bem. Em nome dessa bondade de resultados, o Brasil acaba de assistir a um dos atos mais autoritários dos últimos tempos. Se é que o Brasil notou o fato, em meio aos confetes e serpentinas do proselitismo pansexual.

O Conselho Nacional de Justiça decidiu obrigar os cartórios brasileiros a celebrar o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo. Tudo ótimo, viva a liberdade de escolha, que cada um case com quem quiser e se separe de quem não quiser mais. Só que a bondade do CNJ é ilegal. Trata-se de um órgão administrativo, sem poder de legislar e o casamento, como qualquer direito civil, é uma instituição fundada em lei. O CNJ não tem direito de criar leis, mas tem Joaquim Barbosa.
Joaquim Barbosa presidente do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça é o super-herói social. Homem do povo, representante de minoria, que chegou ao topo do Estado para "dizer as verdades que as pessoas comuns querem dizer". O Brasil é assim, uma mistura de novela com jogo de futebol. Se o sujeito está no papel do mocinho, ou vestindo a camisa do time certo, ele pode tudo. No grito.

Justiceiro, Joaquim liberou o casamento gay na marra e correu para o abraço. Viva o herói progressista! Se a decisão de proveta for mantida, o jeito será rezar para que o CNJ seja sempre bonzinho e não acorde um dia mal-humorado, com vontade de inventar uma lei que proíba jornalistas de criticar suas decisões. Se o que o povo quer" pode ser feito no grito, o que o povo não quiser também pode. O Brasil já cansou de apanhar do autoritarismo, mas não aprende.

E lá vai Joaquim, o redentor, fazendo justiça com as próprias cordas vocais. Numa palestra para estudantes de Direito, declarou que os partidos políticos brasileiros são "de mentirinha". Uma declaração absolutamente irresponsável para a autoridade máxima do Poder Judiciário, que a platéia progressista aplaude ruidosamente.

Se os partidos não cumprem programas e ideias claras, raciocinam os bonzinhos, pedrada neles. Por que então não dizer também que o Brasil tem uma Justiça "de mentirinha"? Juízes despreparados, omissos e corruptos é que não faltam. Quantos políticos criminosos militam tranquilamente nos partidos "de mentirinha", porque a justiça não fez seu papel? A democracia representativa é baseada em partidos políticos. Com todas as suas perversões e são muitas -, eles garantem seu funcionamento. E também legitimam a ação de gente séria que cumpre programas e ideias, pois, se fosse tudo de mentira, um chavista mais esperto já teria mandado embrulhar o pacote todo para presente, com Joaquim e tudo.
A resolução do CNJ sobre o casamento entre homossexuais é uma aberração, um atropelo as instituições pelo arrastão politicamente correto. A defesa da causa gay está ultrapassando a importante conquista de direitos civis para virar circo, explorado pelos espertos. Um jogador de basquete americano anuncia que é homossexual, e isso se torna um espetáculo mundial, um frisson planetário. Como assim? A esta altura? A relação estável entre parceiros do mesmo sexo já não é aceita na maior parte do Ocidente? Por que, então, a decisão do jogador é uma bomba? Simples: a panfletagem pró-gay virou um tiro certo. 

O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, dá declaração solene até sobre a opção sexual dos escoteiros. Talvez, um dia, os gays percebam que foram usados demagogicamente, por um presidente com sustentação política precária, que quer se safar como herói canastrão das minorias.

Ser gay não é orgulho nem vergonha, não é ideologia nem espetáculo, não é chique nem brega. Não é revanche. Não é moderno. Não é moda. É apenas humano.

A luta contra o preconceito precisa ser urgentemente tirada das mãos dos mercadores da bondade. Eles semeiam, sorridentes, a intolerância e o autoritarismo. Já para o armário!

Fonte: Época - 28/05/2013

Consciências fragmentadas: direitos humanos x direitos dos manos

quarta-feira, 20 de março de 2013 1 comentários

Fla-flu esquerda x direita gera esquizofrenia política *


Por Míriam Martinho

Nas últimas semanas, muita gente foi às ruas e a sessões da Câmara Federal protestar contra a indicação do pastor Marco Feliciano para a presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara Federal. Obscurantista profissional, com falas absurdas contra negros e homossexuais, sua nomeação faz parte do festival de escárnios com que a classe política dos país nos brinda cotidianamente. Cumpre ressaltar, aliás, antes de seguir adiante, que essa nomeação é fruto da saída do PT (da comissão da qual sempre foi titular) e de outros partidos, em benefício do PSC, partido de Feliciano, como resultado das negociatas entre os integrantes da base aliada do governo Dilma

Mas voltando ao festival de escárnios, só para listar alguns dos últimos insultos ao povo brasileiro,  também foram nomeados para a CCJ (Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara), os mensaleiros João Paulo Cunha (PT-SP) e José Genoino (PT-SP), condenados, pelo STF, a anos de prisão por formação de quadrilha. 

Para a presidência da CMA (Comissão de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor, Fiscalização e Controle do Senado) foi indicado o ex-governador do Mato Grosso Blairo Maggi (PR-MT), tido como um devastador do meio-ambiente por muitos ecologistas. 

Para a Comissão de Finanças, o deputado João Magalhães (PMDB/MG) que responde a três inquéritos no Supremo Tribunal Federal – por peculato, tráfico de influência e crime contra o sistema financeiro, tendo por isso os bens bloqueados. 

E, na presidência do Senado, ficou Renan Calheiros (PMDB-AL), denunciado pelo procurador da república, Roberto Gurgel, ao Supremo Tribunal Federal (STF), por desvio de dinheiro público, falsidade ideológica e uso de documento falso. Segundo o Ibope, que ouviu mil pessoas entre os dias 3 e 4 de março, 74% dos brasileiros gostariam que o Senado exigisse a renúncia de Calheiros da presidência do órgão, mas até hoje isso ainda não resultou em qualquer ação concreta. 

Como se não bastasse, agora a Procuradoria da Câmara quer controlar a internet para tirar do ar vídeos e comentários que desagradam aos parlamentares, particularmente o conteúdo publicado no portal Blogger e no site de vídeos Youtube, duas das maiores marcas pertencentes ao Google. 

Em resumo, nossa democracia está muito ruim das pernas e protestar é mesmo preciso. Mas por que esses protestos são tão seletivos? Por que os que agora protestam contra a presidência de Feliciano também não protestam contra a participação dos mensaleiros na comissão de justiça e cidadania e, em geral, nunca participaram das marchas contra a corrupção? Por que os que nessas manifestações contra Feliciano levantaram cartazes com os dizeres "Eu tenho fé. Eu tenho fé nos direitos humanos" não estiverem presentes também na defesa da blogueira cubana Yoani Sánchez, quando em visita ao Brasil, impedida de falar em várias ocasiões por uma turba de brucutus autoritários? 

Yoani Sánchez defende os direitos humanos em seu país, às voltas com a mais antiga ditadura da América Latina. Pelo contrário, registrou-se inclusive a presença de ativistas LGBT, como uma tal de Yasmim Nóbrega (que afirmou pertencer à Liga Brasileira de Lésbicas), na manifestação da livraria Cultura, em SP, contra o direito da blogueira falar. Seguramente essa mesma ativista é contrária à presidência de Feliciano na comissão de direitos humanos da Câmara por este ser contra os direitos humanos (sic). Aliás, alguém viu “feministas” se manifestarem contra esses ataques fascistóides que atingiram uma mulher como elas? Alguém viu a Ministra da Justiça, Maria do Rosário, se pronunciar contra os ataques à blogueira? E a OAB e a ABI? Algum comentário? Nada. Silêncio gritante. 

Contra o acossamento a Yoani Sánchez se pronunciaram apenas a chamada direita liberal, alguns poucos da esquerda democrática, os simplesmente civilizados e os oportunistas. Alguns conservadores também encheram a boca para falar na vergonha alheia que sentiam pelo tratamento dado à ilustre visitante cubana, embora os mais extremistas não concordassem em apoiá-la por considerá-la agente de desinformação comunista (há mais estupidez entre a esquerda e a direita do que sonham as vãs filosofias). 

Por outro lado, agora diante da kafkiana nomeação de um paladino contra os direitos humanos para a Comissão de Direitos Humanos da Câmara, alguns dos que se horrorizaram com o tratamento dado a Yoani defendem as falas absurdas de Feliciano, negando, à revelia dos fatos, que sejam racistas ou homofóbicas, alegando que o pastor é vítima da esquerda, dos gays e dos politicamente corretos. O colunista do site da Veja, Reinaldo Azevedo, cada vez mais incoerente, chegou ao ponto de acusar de intolerantes os que foram às ruas protestar contra o descalabro de um discriminador numa comissão destinada a combater a discriminação contra minorias. Para ele, a verdade é que os manifestantes querem cassar a liberdade de expressão (sic) do pastor, tadinho.

É necessário reaglutinar os setores realmente democráticos da sociedade brasileira sob a bandeira do conceito de universalidade dos direitos humanos, aqueles direitos inerentes a quaisquer indivíduos, não importando sua doutrina ou ideologia, a que partido pertença, em que país viva, seu sexo, etnia, orientação sexual ou crença religiosa.

Vale salientar que o conceito de liberdade de expressão se transformou, na boca de muitos ditos conservadores, num termo bombril que, entre suas mil e uma utilidades, também se presta a passe livre para o incitamento ao ódio a segmentos da população mais vulneráveis, sobretudo os homossexuais. Incitamento ao ódio que conspira – diga-se de passagem - contra a harmonia social e resulta em ações contra os direitos civis de parte da população brasileira. Não custa lembrar que foi com discursos de ódio que os totalitários nazifascistas e comunistas pavimentaram o caminho rumo aos campos de concentração e às execuções em massa de populações por eles estigmatizadas. Palavras não são meras bolhas de sabão. Muitas funcionam como cimento na construção das barbáries várias que mancham a história da humanidade. Basta que elas cheguem ao poder de Estado para que se transformem de opiniões que devemos respeitar, por mais que as detestemos, em ações concretas contra  bodes-expiatórios de ocasião. Há que se refletir sobre isso. 

É certo que o clima para o debate civilizado sobre liberdade de expressão em nosso país está anuviado pelas permanentes ameaças contra a imprensa vindas do PT, de setores da esquerda autoritária e de seus movimentos sociais amestrados, com os tais “marcos regulatórios da mídia”, “democratização das comunicações”, toda essa novilíngua que tenta esconder a simples intenção de censura. Fora todo o contexto latino-americano de claro cerceamento à liberdade de opinião. Entretanto, também é certo que muitos obscurantistas estão se valendo desse mau tempo para sair desopilando seus fígados cirróticos às custas de segmentos da população a que se acostumaram a ver como Genis, contra os quais se pode jogar josta impunemente, sob a desculpa esfarrapada de que o autocontrole imprescindível à vida em sociedade é de fato um cerceamento à liberdade de expressão. Não, não é não. 

Em resumo, a sociedade brasileira engajada em política vive um quadro esquizofrênico. Os direitos humanos foram substituídos pelos direitos dos manos. Se uma causa ou a vítima de alguma violência é tida como de “esquerda”, protestam os que se identificam como de “esquerda”. Os de “direita” se omitem contra os abusos (sobre o caso Feliciano, ouvi de um mané :“essa briga é entre evangélicos e gays, não é minha”,) ou buscam banalizar a violência, ou até justificá-la, ou desmerecer a causa em questão. Se uma causa ou a vítima de alguma violência é tida como de “direita”, protestam os que se identificam como de “direita”. Os de “esquerda” se omitem ou buscam banalizar a violência, ou até justificá-la, ou desmerecer a causa em pauta (“essa Yoani Sánchez é porta-voz da mídia de direita, agente da CIA, mercenária, por isso que se dane se a impedem de falar”). 

Enfim, de verdadeiros defensores dos direitos humanos esses opostos que quase se tocam não têm nada. São consciências fragmentadas atuando em curraizinhos doutrinários e ideológicos na defesa apenas de seus manos de “direita” ou de “esquerda”. Chama a atenção como criticam nos seus opostos o comportamento que é comum a ambos, buscando justificar sua parcialidade no trato da questão dos direitos humanos com base na igual parcialidade de seus inimigos políticos. Esse posicionamento pareceria simples birra de criança mimada não tivesse consequências nada pueris: “como você não é da minha turma, não pensa como eu, não vou defender nada do que você defende”. Se o que um lado ou outro defende tem fundamento não importa porque, como quadrúpedes, os defensores dos direitos dos manos levam viseira e só enxergam numa direção. 

Faz tempo que a consciência dessa esquizofrenia vem crescendo em minha mente e me deixando angustiada pela falta de alternativas a que ela leva o Brasil. Felizmente, parece que não estou sozinha nessa percepção. Nesta última sexta-feira, o jornalista Fernando Gabeira escreveu um artigo para o Estadão, intitulado É o fundo do poço, é o fim do caminho que vai na mesma direção da minha reflexão. Diz o jornalista sobre a nomeação de Feliciano (atentar para meus sublinhados): 

“Não foi um relâmpago em céu azul, mas resultado de um longo processo de degradação que transformou o Congresso desenhado por Niemeyer numa espécie de caverna sombria, com lógica oposta à da sociedade, que a mantém. Ao longo desses anos a comissão sempre foi dirigida pela esquerda. Partidos de outros matizes não se interessam por ela, associando, erradamente, direitos humanos à esquerda. A longa hegemonia de um setor acabou enfraquecendo o tema, uma vez que o viés ideológico tende a enxergar humanidade apenas no seu campo político.

Um grande mérito dos direitos humanos é sua universalidade. São direitos de um indivíduo, não importa a que partido pertença, em que país tenha nascido ou viva. Quando Lula comparou os presos políticos de Cuba aos traficantes do PCC, o movimento não reclamou. Quando comparou os opositores em luta no Irã a torcidas de futebol, novo silêncio. Há pouca solidariedade com as populações que vivem sob o controle armado do tráfico. E uma tendência histórica é ver o policial apenas como um transgressor dos direitos humanos, ignorando até os que morrem em atos de bravura. 

Abandonada pelos grandes partidos, a comissão foi, finalmente, rejeitada pelo PT. A esquerda não compreendeu integralmente o conceito de universalidade e a direita, ao ignorar os direitos humanos, joga fora o bebê com a água de banho.

Não foram nossos erros no movimento de direitos humanos que trouxeram Feliciano ao centro da cena. Ele não chegou ao topo à frente de uma onda racista e anti-homossexual, apesar de suas declarações bombásticas. Ele triunfou porque é cafajeste, e essa condição hoje é indispensável para o ascender no Congresso. Expressa um longo processo de degradação impulsionado pelo PT. 

Exato. Repito e acrescento: a longa hegemonia da esquerda sobre a área dos direitos humanos acabou enfraquecendo o tema, uma vez que o viés ideológico tende a enxergar humanidade apenas no seu campo político. A esquerda não compreende integralmente o conceito de universalidade, e a direita, ao ignorar os direitos humanos, joga fora o bebê com a água suja da bacia. Toda essa situação expressa um longo processo de degradação impulsionado pelo PT, de fato o grande beneficário de toda essa fragmentação das consciências que leva à corrosão das estruturas democráticas.

Basta ver que, por trás das agressões à Yoani Sánchez, esteve o petismo em conluio com o embaixador cubano em nosso país, num atentado à soberania nacional. Basta ver também que foi, principalmente graças à vacância do PT da comissão de direitos humanos, da qual o partido sempre foi titular, em benefício do PSC de Feliciano, que o dito chegou à presidência dessa instância. Que petistas estejam agora participando de protestos contra a presença de Feliciano na comissão de direitos humanos não espanta. À parte seu proverbial cinismo, essas participações também funcionam como cortina de fumaça a escamotear as nomeações dos mensaleiros petistas Genoíno e Paulo Cunha, para a comissão de Justiça e Cidadania, e sobretudo como forma de não perder o controle sobre os movimentos sociais a quem encabrestraram faz tempo. (Nas fotos das manifestações contra Feliciano, viram-se também cartazes contra Renan e Baggi, mas nada sobre Genoíno e Paulo Cunha).

Gabeira termina seu texto desconsolado, dizendo desconhecer como reconstruir a ruína em que se transformou o Congresso Nacional e que estreita o horizonte do país. Concordo que a situação é desoladora, mas prefiro apontar para uma possível solução a mergulhar na desesperança: é necessário reaglutinar os setores realmente democráticos da sociedade brasileira sob a bandeira do conceito de universalidade dos direitos humanos, aqueles direitos inerentes a quaisquer indivíduos, não importando sua doutrina ou ideologia, a que partido pertença, em que país viva, seu sexo, etnia, orientação sexual ou crença religiosa. Salientando que o conceito de universalidade dos direitos humanos não é mero blá-blá-blá a fim de mascarar as desigualdades para eternizá-las e fomentar o conformismo entre os discriminados. Buscar igualdade de oportunidades para todos perante a vida e igualdade perante a lei são essenciais para a efetivação do ideal da universalidade dos direitos humanos.

É imprescindível, portanto, lançar uma ponte sobre as consciências fragmentadas dos participantes desse fla-flu de bregas de esquerda versus jecas de direita, pois estes apenas se retroalimentam dos próprios excessos, hipocrisia, ódio e discórdia às custas do futuro da sociedade brasileira. Não há outra saída.

* Fotomontagem a partir da capa do livro La mente dividida, La Epidemia de los trastornos psicosomáticos

A segunda geração (de lesbianas)

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013 2 comentários

Relação de nova geração de lesbianas com mundo é bem mais tranquila do que a anterior

Por Beth Andrade

Há algum tempo, escrevi um texto sobre a sobrinha Jú. Naquela época, a sobrinha era uma adolescente lésbica com sofrer típico da idade. Anos depois, ao recebê-la com sua namorada aqui em casa, dou conta de que além de velha, contemplo a segunda geração assumidamente lésbica da família. E como é bom ver os avanços dessa garotada através da Jú.

Olhando a Jú, agora do alto dos seus 20 anos e com um monte de sonhos e objetivos (entre eles, obviamente, morar com a sua garota, como toda menina apaixonada), ela em nada lembra aquela adolescente que, em meio ao turbilhão de hormônios, sofria sem ter motivos aparentes. E como os anos a fizeram bem. Vejo um ser sem grilos com sua sexualidade. Sem medo de andar de mãos dadas com sua namorada onde quer que seja. Confesso que rola até uma pontinha de inveja. 

Ouvir as duas contarem como foi a primeira noite dormida na casa da Jú, os papos da namorada com a sogra e dividir gargalhadas com as histórias de quem tentou causar boa impressão é simplesmente uma experiência maravilhosa. Os 15 anos que nos separam me fazem acreditar que a sociedade está se transformando.

Com mais ou menos idade que a Jú, dormir com a minha namorada na casa da minha mãe nem passava pela minha cabeça. Ou melhor, passava e até aconteceu algumas poucas vezes, mas meus pais não estavam por lá, então acho que não conta, certo? O fato é que vejo que a relação da Jú com o mundo é bem melhor que a minha. Há uma espécie de evolução. Com a família, os amigos, a faculdade e por aí vai.

Eu precisei sair de casa e morar com minha namorada para conquistar o respeito da minha relação homoafetiva. E olhem que ainda assim levou tempo. Quem vê meus pais convivendo com a minha mulher não imagina quanto tempo levou para que isso fosse possível. Arrisco dizer que levou pelo menos um ano para receber a visita da minha mãe na minha casa. E, acreditem, foi estranho para nós duas. Mas com a Jú é diferente. Ela leva a namorada para dormir na casa dela. Conquistaram seu espaço no sofá da mãe/sogra sem grandes crises (é claro que sempre há a crise de se assumir para os pais e dessa ela não escapou, mas até nisso ela se deu bem). E isso é ótimo.

Não dá para saber se haverá uma terceira geração ainda mais livre, mas essa, com seu frescor e sem dar muita bola para as votações do casamento gay na França ou as discussões acaloradas sobre as convicções do pastor Malafaia, me enche de orgulho e esperança em um futuro com menos questionamentos e mais entendimentos.

Ver também da autora O café na cama nosso de cada dia 

Renúncia do Papa e as contradições do Vaticano sobre direitos LGBT

terça-feira, 12 de fevereiro de 2013 0 comentários

Img: ATEA 

A todo o vapor na luta contra o casamento igualitário, nos últimos dias a nada Santa Madre Igreja surpreendeu a todos com as declarações do ministro do Vaticano para a família, monsenhor Vincenzo Paglia, presidente do Conselho Pontifício da Família, que se pronunciou a favor dos direitos homossexuais e depois desmentiu a abertura sobre o tema, e ontem com a renúncia do Papa Bento XVI, o quarto a renunciar na história da instituição. Os outros foram:  Gregório XII, em 1415; Celestino V, em 1294; e Ponciano, em 235.

Renúncia se trata, portanto, de evento raro na trajetória do papado e está dando e ainda dará muito o que falar daqui por diante. Por ora, fiquemos com uma razão bem-humorada para a demissão desse papa conservador que já vai tarde: não aguentava mais o vento que fazia as roupinhas de papa lhe baterem na cara deixando-o mais cego do que as ideias anacrônicas que defende costumavam fazer. Não habemus mais papam! Olê!  N.E.


Ministro do Vaticano desmente abertura a direitos dos gays

"Minhas palavras foram deturpadas deliberadamente", acrescentou o religioso


Cidade do Vaticano - O ministro do Vaticano para a família, monsenhor Vincenzo Paglia, presidente do Conselho Pontifício da Família, desmentiu nesta quarta-feira que tenha se pronunciado em favor dos direitos para casais "de fato", homossexuais ou não, negando uma abertura por parte da hierarquia da Igreja Católica sobre o tema.

Entrevistado pela Rádio Vaticano, Paglia manifestou sua "surpresa" diante da interpretação feita pela imprensa de suas declarações.

"Minhas palavras foram deturpadas deliberadamente", acrescentou o religioso.

"Minhas declarações não só não foram entendidas, como tampouco se compreendeu o afeto com que foram ditas. A verdade é que foram desviadas, talvez conscientemente", acrescentou.

"Uma coisa é pedir que se verifique se nas instituições existentes é possível extrair normas que protejam os direitos individuais, outra coisa muito diferente é aprovar certas perspectivas", afirmou.

Em um encontro na segunda-feira com a imprensa, Paglia explicou que a situação dos casais de fato, homossexuais ou não, tinha que ser resolvida pelo Estado para impedir injustiças e discriminações.
O religioso reiterou novamente sua defesa do casamento tradicional, entre um homem e uma mulher, que considera o "elemento fundador" da sociedade e reforçou que aprova "plenamente" a condenação ao casamento gay pronunciada pelos bispos do Reino Unido e da França, países que acabam de legalizar tais uniões.

"A doutrina da Igreja é clara, assim como a tradição jurídica milenar do casamento em todas as culturas: para fundar uma família é necessário um homem e uma mulher", reforçou.

"Desviar-se deste caminho (...) leva à instabilidade e à decomposição da sociedade humana", comentou.

"As formas de vida em comum não familiares constituem um verdadeiro arquipélago de situações. É claro que deve-se garantir os direitos individuais", assegurou.

As afirmações do prelado, que geraram reações da imprensa e dos movimentos italianos de defesa dos homossexuais, caíram mal na Cúria Romana, que não costuma comunicar as divisões internas sobre temas tão polêmicos.

Fonte: Exame via AFP, 06/02/2013

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