Batom ou Camisa Xadrez?

segunda-feira, 30 de abril de 2012 1 comentários

Da camisa xadrez da butch...
Autora: Stella Ferraz

Uma das razões pela qual Joana D’Arc foi para a fogueira é porque insistia em usar roupas masculinas. Embora houvesse também razões de ordem política, os trajes que a jovem francesa usava escandalizavam e, pior, estavam absolutamente fora das normas prescritas para as mulheres da época. Se o hábito não faz o monge, com certeza lhe dá a aparência de um. Há um dito na comunidade árabe que afirma que eles recebem as pessoas como elas se apresentam, mas se despedem de acordo como elas são. 

A verdade é que o vestuário tem muito a ver com a mensagem que queremos dar de nós mesmas. Até recentemente o traje discriminava as pessoas por idade (crianças, jovens, adultos e idosos) e classe social (realeza, nobreza, burguesia, povo): a menina devia vestir-se de uma determinada forma, a mulher casada de outra e a viúva ainda de um terceiro modo. O mesmo com os rapazes; usavam calças curtas em pequenos, e o uso de calças compridas, marcava para eles a passagem a um estágio mais maduro de vida.

No decorrer do tempo, a roupa tem sido um sinal exterior de classe social e status na sociedade. Os escravos brasileiros eram obrigados a usar roupas brancas, e não lhes permitiam outra cor senão essa, para dificultar-lhes a fuga. Basta conferir as célebres pinturas de Debret e Rugendas com nossos negros, todos devidamente uniformizados em branco. Da mesma forma os presos usavam roupas listradas, para discriminá-los e tornar-lhes complicada a evasão do presídio.

Na Idade Média, certos tipos de tecidos e cores eram privilégios da nobreza. A burguesia também se distinguia das demais classes por roupas que lhes eram próprias e não se confundiam com as da realeza. Em nosso passado recente, a palavra da ordem da esquerda era o uso da roupa o mais próxima possível do padrão operário, num esforço para identificar-se e vestir seus ideais, enquanto que a pequena burguesia corre sempre atrás das etiquetas e grifes para aparentar um status e um poder aquisitivo que está longe de ter.

... pela liberação de Coco Chanel....
A virada de Coco Chanel

 Este final de século e de milênio marca a transição entre as imposições da veste e a liberação dessas imposições. Para essa virada, houve uma mulher que desempenhou um papel preponderante: Coco Chanel, que desenhou trajes práticos para as mulheres e inventou o prêt-à-porter, o pronto para vestir, que dispensava a costureira particular, era produzido em série e muito mais barato. A partir dela, a moda passou a ser algo ao alcance do proletariado e da pequena burguesia.

 Hoje é comum vermos mulheres de meia idade em trajes de juventude sem com isso criar escândalo. Já não se impõe uma veste que discrimine ou que privilegie. Cadeias de lojas como C&A e Marisa oferecerem modelos da moda a custo popular. Não somos mais obrigadas a nos vestir dentro de um determinado modelo. Hoje, mais do que nunca, quem dita a moda e a forma de se vestir somos nós mesmas.

Já podemos vestir o que sentimos que somos. Não há mais imposições externas, salvo, claro, uns poucos, por exemplo, quando você é advogada e deve ir ao Fórum. Ali, você em que usar uma saia, quer queira quer não.

O importante é que cada uma pode vestir o que é. Ou o que sente que é. Aí entra a tipologia: as que fazem o gênero butch ou caminhoneira, porque se sentem mais masculinas e querem ser vistas e compreendidas desse modo, e outras que se entendem por chics e já ganharam o preconceituoso apelido de lesbian chic.

.... às lesbian chics
Muitas butches, menos providas de idéias, procuram no guarda-roupa básico masculino a sua melhor expressão: camisa xadrez larga que lhe disfarce o busto, jeans (com a carteira no bolso de trás) e mocassino. As mais inspiradas atacam de camiseta pólo e outros modelitos menos batidos com a mesma calça jeans e o mesmo mocassino.

Meu primeiro romance GLS, Preciso Te Ver, foi considerado por muita gente um cenário de lesbian chics. As personagens principais usavam lenços Hermes (que nem a própria autora pode comprar e modelitos Chanel. Não que só houvesse lesbian chics na estória, havia jornalistas que usavam camisetas com slogans e veterinárias de botina. Mas o que marcou foram as heroínas, que andavam mesmo com todos os signos de poder aquisitivo. Nesse romance eu me guiei pela máxima de Joãozinho Trinta: pobre gosta de luxo; intelectual é que gosta de pobreza.

Vestida para ser a gente mesma
Em meu segundo romance, A vila das meninas, absorvi as críticas, deixei o conselho do Carnavalesco de lado, e situei a cena num ambiente em que as pessoas pegavam o ônibus, usavam camiseta Hering e comiam pastel. Enfim, as personagens tinham um estilo de vida inclusive ao alcance de sua autora. A roupa ajudou a situar quem eram as personagens.

E aí chegamos ao que interessa: lesbian chic ou butch, ou, simplesmente, mulheres que amam mulheres e amam se vestir cada qual de seu jeito, o importante é que nos conheçamos para saber o que melhor nos cai bem, o que melhor nos favorece dentro de um estilo nosso, que faz a nossa cabeça.

O autoconhecimento vai nos ajudar a selecionar o que queremos vestir. Mesmo aquelas que parecem não ligar para roupa e para moda, muitas vezes, na verdade, estão sinalizando: eu me visto assim porque não me preocupa a roupa, mas o conteúdo. Pode estar sinalizando sem querer, no entanto, que é uma pessoa que cabe no ditado: quem se enjeita se rejeita... E dar a ideia de que se não é capaz de cuidar de si, muito menos dos outros e de uma namorada.

Outras que capricham demais, podem estar passando a sensação de vácuo, vazio interior. O que pode resultar num primeiro movimento de rejeição, da mesma forma como se dá com as desmazeladas. Muitas vezes nos sentimos muitas, várias em uma. Pelo menos é como eu me sinto: num dia, executiva, no outro butch, no seguinte chic ou feminina. E acabo compondo um visual para cada momento: hoje é  jeans, amanhã uma calça com pregas, depois de amanhã um vestido e salto alto. Mas em todas essas variações há uma constância que sou eu e meu estilo.

Sejamos uma ou várias, o importante é vestirmos o que realmente somos. Joana D’Arc foi condenada por vestir-se de homem e nós seremos se nos vestirmos de outra coisa que não nós mesmas.

Stella C. Ferraz é autora dos romances lésbicos Preciso te Ver e A Vila das Meninas, publicados pela ed. Brasiliense. Artigo originalmente produzido para a Revista Um Outro Olhar n. 34

Portal de música eletrônica LGBT divulga o single "Call me Bitch"

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portal de música eletrônica para o público LGBT
Divulgação da música Call me Bitch pelo Ômega Hitz, portal de música eletrônica para o público LGBT. Segue o texto de divulgação, link do ômega Hitz e o single. Para quem gosta do gênero, uma boa pedida.

Nas vozes das divas Nicky Valentine e Natalia Damini, o single produzido por Patrick Sandim está agitando as pistas de todo o país.

A parceria de Nicky Valentine com Natalia Damini para Call Me Bitch é sucesso nas pistas de todo o Brasil. Produzida por Patrick Sandim, com remixes assinados por influentes produtores nacionais e internacionais, a faixa já é considerada um dois his de 2012. Presença forte nos principais clubes e rádios do país, o single é destaque nos sets de importantes nomes como Bruno Pacheco, Ana Flor, Breno Barreto, Tommy Love, entre outros DJs do cenário eletrônico. Além de debutar em diversos charts de música eletrônica pelo Brasil.

Call Me Bitch é o primeiro projeto entre duas cantoras da cena eletrônica nacional. O sucesso rendeu uma tour - que leva o nome do hit - por diversos lugares do Brasil. Elogiada pelos DJs, mídia e cena eletrônica,  Call Me Bitch  consagrou suas interpretes e revelou Dj Patrick Sandim, hoje residente de importantes projetos em São Paulo, com turnê promocional já marcada pelas principais capitais.

Nicky Valentine é a voz principal do single e o convite para Natalia Damini aconteceu em Abril de 2011, quando Damini apresentava seu segundo single, Your Lies. A faixa lançada em Janeiro, figurou com destaque no carnaval, ganha força nos principais clubes pelo Brasil, além de ocupar a primeira posição entre os singles mais pedidos na Ômega Hitz, maior portal de música eletrônica para o público LGBT.

Casamento civil entre pessoas do mesmo sexo: os mesmos direitos com os mesmos nomes

quinta-feira, 26 de abril de 2012 0 comentários

Divulgando abaixo o texto do portal Casamento Civil Igualitário, uma campanha que vale a pena encampar. Direitos iguais, sem mais nem menos. Vai ser uma batalha dura, mas uma caminhada precisa mesmo de um primeiro passo, e ele foi dado. Vamos caminhar juntos. Ao fim do texto, o link para o abaixo-assinado em apoio à PEC do Jean Wyllys. Esta postagem ficará em destaque de agora em diante.

Nós, brasileiras e brasileiros de todas as idades e de todas as cores, de todas as religiões e crenças ou de nenhuma delas, de todas as orientações sexuais e identidades de gênero, falantes de diferentes sotaques e das mais diversas gramáticas do português brasileiro — e de outras línguas, trabalhadores/as das mais diversas profissões e moradores/as de todas as regiões, do centro e da periferia, do morro e do asfalto, queremos expressar nosso apoio incondicional ao projeto de emenda constitucional apresentado pelo deputado federal Jean Wyllys para garantir o direito ao casamento civil aos casais do mesmo sexo.

Porque acreditamos que “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos”, como diz a Declaração Universal dos Direitos Humanos, e que “Todos são iguais perante a lei e, sem distinção, têm direito a igual proteção da lei”, como diz a Constituição brasileira.

Porque a proibição do casamento civil aos homossexuais é uma violação aos direitos humanos, inadmissível numa sociedade democrática, que não só exclui os casais do mesmos sexo e suas famílias do acesso a dezenas de direitos reconhecidos na lei aos casados, como também os humilha e desrespeita, privando-os do reconhecimento simbólico que a instituição do casamento civil representa na nossa cultura e tratando-os como se eles e suas famílias fossem menos valiosos do que o resto das pessoas.

Porque o Judiciário já tem avançado no reconhecimento do direito ao casamento civil dos/as homossexuais, e o Legislativo não pode continuar se omitindo, obrigando as pessoas a entrarem com ações na justiça para exercer um direito fundamental, reconhecido em todos os tratados internacionais, como é o direito a se casar com a pessoa que amam.

Por isso tudo, reclamamos ao Congresso a urgente aprovação da emenda constitucional do casamento igualitário e dizemos, com os LGBT, que queremos, para todos e todas, os mesmos direitos com os mesmos nomes.

Jean Wyllys: "Não existe Estado de direito enquanto o casamento for negado aos homossexuais"  

Pe. Marcelo Rossi: "Casamento entre homossexuais não é de Deus"

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Pe. Marcelo Rossi
O Brasil tem problemas seríssimos a encarar: saúde e educação sucateadas, infraestrutura idem, desindustrialização, corrupção pandêmica, e por aí vai. Apesar de tanta coisa sobre o que pensar e sobretudo tanta coisa para se mudar, os únicos motivos para polêmica, no país, parecem ser os temas relativos a moral e aos costumes, protagonizados principalmente por duas turmas em permanente conflito: ativistas LGBT e conservadores religiosos. Mal acaba uma polêmica e já se instaura outra em função de excessos de ambos os lados.

A mais nova se relaciona com as declarações do  padre Marcelo Rossi  sobre casamento homossexual. Em entrevista à revista Quem desta semana, o padre afirmou que respeita o casamento entre homossexuais, apesar de a palavra de Deus ser clara que o homem e a mulher foram criados para unirem e dar frutos. “Respeitamos, não quero fazer polêmica, mas todo cristão que crê na palavra de Deus sabe que existe os dois. Fora isso, não é de Deus”, argumentou.

Diante da obstinada oposição desses religiosos aos direitos civis de um segmento da população brasileira, em nome de Deus, só nos resta pedir para conversar com este senhor, sem intermediários, e confirmar as razões que ele tem para se opor aos direitos humanos. E se ele não aparecer para o debate, dá-se o assunto por encerrado, pois não?

Falando nisso, vamos assinar a PEC em favor do casamento igualitário. 

Em Israel, corrente conservadora passa a aceitar a ordenação de rabinos LGBT

segunda-feira, 23 de abril de 2012 0 comentários

Na última sexta-feira, a corrente conservadora do judaísmo, chamado Movimento Conservador, decidiu admitir a presença de gays e lésbicas como candidatos ao rabinato em Israel, à semelhança do que já ocorre nos Estados Unidos há alguns anos. 

A decisão foi tomada, por quase unanimidade (apenas um rabino dos 18 votantes se absteve de votar), pelo conceituado seminário rabínico Schechter, em Jerusalém, com base numa espécie de isonomia religiosa, ou seja, todos são iguais não apenas perante a lei mas também aos olhos de Deus, já que todos são feitos à sua imagem. Os estudantes gays e lésbicas começam a poder participar para o curso de ordenação que dura dois anos já no próximo ano letivo. 

Agora, das  três principais correntes do judaísmo — reformista, conservadora e ortodoxa — apenas a ortodoxa segue mantendo-se contrária à ordenação de gays e lésbicas bem como de quaisquer mulheres como líderes religiosas. E como é esta corrente que monopoliza os serviços públicos ligados à religião, como casamentos (não existe união civil no país) e funerais, os futuros rabinos homossexuais ainda terão bastante trabalho pelo frente para obter plena aceitação.

Fonte: Com informações de O Globo

Procura-se mulher feminina. Para quê?

sábado, 21 de abril de 2012 4 comentários

amizade entre lésbicas
Autora: Míriam Martinho

De vez em quando aceito um daqueles convites tipo “Fulana de Tal quer ser sua amiga no ...”, ou “beltrana convidou você para participar da comunidade ou grupo X no ....” ou ainda eu mesma ponho um anúncio nos sites que tem classificados a fim de fazer amizade e trocar umas palavras. Nessas, no pouco tempo que tenho para tais coisas, até consegui bater uns bons e divertidos papos furados com algumas mulheres dos 4 cantos desse nosso Brasil cor de anil.

No geral, contudo, a experiência é meio frustrante porque a maioria das lésbicas vive em estado permanente de caça, caça para ficar, caça para casar, e amizade simplesmente - que é bom – nada. Aliás, a palavra amizade, para a maioria das lésbicas, parece ser uma espécie de código que significa na verdade que você está em temporada... de caça.

Se não, me digam, por que haveria alguém que está apenas em busca de amizade querer saber se você é feminina, masculina ou andrógina? Nas primeiras tecladas com uma dessas caçadoiras enrustidas, pois dizia que estava em busca de amizade, um bom tempo da conversa girou em torno de saber a minha aparência física, não se eu era gorda ou magra, alta ou baixa, mas sim se eu pintava os cabelos e as unhas, fazia a sobrancelha, usava batom, saia e sapato de salto porque ela fazia tudo isso e assim é que apreciava uma outra mulher.

Convenhamos que, quando nossa busca é por uma parceira sexual ou amorosa, para ficar ou casar, até que requisitos como os citados acima podem fazer uma boa diferença. Eu mesma não tenho tesão pelo masculino seja em homens seja em mulheres. O masculino me evoca várias coisas, a maioria delas positivas, mas não me atrai sexualmente. Meu lugar do desejo é mesmo o feminino naturalmente nas mulheres mas até em homens (certa vez me peguei impressionada por uma travesti super-feminina...rsss). Não falo do feminino tipo perua, pois não me agrada muito a estética over, mas o feminino light, discreto e charmoso.

Agora, quando o assunto é amizade, o que me interessa é se a mulher em questão é boa pessoa, se tenho afinidades com ela, de gostos, de humor. Nesse sentido, tanto faz sua aparência, se a figura é feminina, masculina, andrógina, se é negra, branca, oriental, alta, baixa, destra ou ambidestra, subaquática....

Na verdade, essa busca de mulheres femininas, até para simples amizade, tem muito a ver com o preconceito contra a visibilidade das mulheres masculinizadas, visibilidade lésbica, que fique claro, e também com a necessidade de se encaixar num papel mais palatável aos olhos heterossexuais. Para as enrustidas, que ainda há aos montes, uma butch é uma saída do armário a ser evitada. Para as normalizadoras, uma butch incomoda porque não se encaixa no modelito feminista da igualdade entre os pares que, transportado do terreno da cidadania para o da sexualidade, resulta simplesmente desastroso, pois preconiza que as parceiras têm que ser iguais na cama e no visual, em outras palavras, ambas femininas.

Tive uma colega butchezinha que tinha uma namorada bem femme e que, na cama, adorava os papéis assim bem divididos, mas que, no social, morria de vergonha do caso. Daí que na rua elas fingiam que não se conheciam, pois a moça não queria ser vista com aquela bandeira ambulante que era sua amante butch. O mais tristemente engraçado é que essa minha colega butch aceitava essa situação humilhante. Tá certo que a menina era uma gatinha, mas gatinhas existem muitas e com uma cabeça bem melhor.

Então, tanto nos discriminaram e não aprendemos nada com isso? Na hora do vamos ver, também discriminamos? Que maus! Deixemos disso e retomemos o aprendizado do respeito a todas as identidades lésbicas existentes, das sapatilhas às sapatonas, das entendidas às lésbicas politizadas, lembrando que, como diz o ditado, principalmente quando o assunto é amizade, quem vê cara não vê coração.

Perseguição aos gays - Mario Vargas Llosa

quinta-feira, 19 de abril de 2012 1 comentários

Mário Vargas Llosa
Segue abaixo, em boa tradução de Terezinha Martino, o texto La Caza del Gay (Perseguição aos Gays) do escritor liberal Mario Vargas Llosa, publicado no último domingo (15/04), no Estado de São Paulo. O texto original vem depois à guisa de comparação.

Apenas para atualizar, após o brutal assassinato do jovem gay chileno, Daniel Zamudio, o governo de Sebastián Piñera agilizou o encaminhamento do Projeto de Lei que Estabelece Medidas contra a Discriminação, aprovado em 4 de abril último. A imolação de Zamudio, como disse o escritor, portanto, não foi em vão. Abordaremos esse projeto em detalhes posteriormente.

O melhor do texto de Llosa é sua análise das origens do preconceito e da discriminação às pessoas homossexuais quando afirma: O tema não é político, mas religioso e cultural. Fomos acostumados desde tempos imemoriais à ideia de que existe uma ortodoxia sexual da qual apenas os pervertidos, os loucos e enfermos se afastam e vimos transmitindo esse absurdo monstruoso para nossos filhos, netos e bisnetos, auxiliados pelos dogmas da religião, os códigos morais e os hábitos instaurados. Temos medo do sexo e nos custa aceitar que, neste incerto domínio, há opções e variantes que devam ser aceitas como manifestações da diversidade humana. Nesse aspecto da condição de homens e mulheres deve reinar a liberdade, permitindo que na vida sexual cada um escolha sua conduta e vocação sem outra limitação senão o respeito e a aquiescência do próximo.

Perseguição aos gays

Na noite de 3 de março, quatro neonazistas chilenos, liderados por um valentão chamado Pato Core, encontraram caído nas cercanias do Parque Borja, em Santiago, o jovem Daniel Zamudio, ativista homossexual de 24 anos que trabalhava como vendedor numa loja de roupas. Durante seis horas, enquanto bebiam e pilheriavam, os quatro se dedicaram a dar pontapés e socos no jovem homossexual, golpeá-lo com pedras e marcar suásticas no seu peito e costas com o gargalo de uma garrafa. Ao amanhecer, ele foi levado a um hospital, onde agonizou por 25 dias antes de morrer em decorrência dos traumatismos.

O crime causou uma vivo impacto na opinião pública chilena e sul-americana. Multiplicaram-se as condenações à discriminação e ao ódio contra as minorias sexuais, profundamente enraizados em toda América Latina. O presidente do Chile, Sebastián Piñera, exigiu pena exemplar e pediu que se acelere a aprovação de um projeto de lei contra a discriminação, que vegeta no Parlamento chileno há sete anos, parado nas comissões por temor dos parlamentares conservadores de que a lei, se aprovada, abra caminho para o casamento entre gays.

Esperemos que a imolação de Daniel Zamudio sirva para trazer à luz a trágica condição dos homossexuais, lésbicas e transexuais nos países latino-americanos onde, sem uma única exceção, são objeto de escárnio, repressão, marginalizados, perseguidos e alvo de campanhas de descrédito que, no geral, contam com o apoio declarado e entusiasmado da maioria da opinião pública.

Nesse caso, o mais fácil e mais hipócrita é atribuir a morte do jovem apenas a quatro canalhas pobres diabos que se denominam neonazistas e, provavelmente, nem sabem o que é isso. Eles não são mais do que a guarda avançada mais crua de uma cultura antiga que apresenta o gay ou a lésbica como pessoas doentes ou depravadas que devem ser mantidas à distância dos seres normais, pois corrompem o corpo social saudável, induzindo-o a pecar e a se desintegrar moral e fisicamente em práticas perversas e nefandas.

Esta noção do homossexualismo é ensinada nas escolas, difundida no seio das famílias, pregada nos púlpitos, divulgada pelos meios de comunicação, aparece nos discursos de políticos, nos programas de rádio e televisão e nas comédias teatrais onde os homossexuais são sempre personagens grotescos, anômalos, ridículos e perigosos, merecedores do desprezo e da rejeição dos seres decentes, normais e comuns. O gay é sempre "o outro", o que nos constrange, assusta e fascina ao mesmo tempo, como o olhar da cobra assassina para o passarinho inocente.

Num tal contexto, o surpreendente não é que se cometam atos abomináveis como o sacrifício de Zamudio, mas o fato de que sejam tão pouco frequentes, ou talvez seja mais correto dizer tão pouco conhecidos, pois os crimes provocados pela homofobia que vêm a público são só uma pequena parte dos que realmente são praticados. Em muitos casos, as próprias famílias das vítimas preferem colocar um véu de silêncio sobre eles para evitar a desonra e a vergonha.

Tenho comigo, por exemplo, um relatório preparado pelo Movimento Homossexual de Lima, que me foi enviado pelo seu presidente, Giovanny Romero Infante. De acordo com uma pesquisa realizada entre 2006 e 2010, foram assassinadas no Peru 249 pessoas por "sua orientação sexual e identidade de gênero", ou seja, uma a cada semana. Entre os casos mais horripilantes está o de Yefri Peña, que teve o rosto e o corpo desfigurado com um pedaço de vidro por cinco "machões", os policiais se negaram a socorrê-la por ser travesti e os médicos de um hospital não quiseram atendê-la por considerá-la um "foco infeccioso" que se poderia transmitir aos que estavam em torno.

Os casos extremos são atrozes, mas o mais terrível para uma lésbica, gay ou transexual em países como Peru ou Chile não são casos mais excepcionais como esse, mas é a sua vida quotidiana condenada à insegurança, ao medo, a percepção constante de ser considerado perverso, anormal, um monstro.

Ter de viver na dissimulação, com o temor constante de ser descoberto e estigmatizado pelos pais, parentes, amigos e todo um círculo social preconceituoso que ataca furiosamente o gay como se ele tivesse uma doença contagiosa. Quantos jovens atormentados por esta censura social foram levados ao suicídio ou sofreram traumas que arruinaram suas vidas? Somente no círculo de amigos meus tenho conhecimento de muitos exemplos que não foram denunciados na imprensa nem apareceram nos programas sociais dos reformadores e progressistas.

Porque, no que se refere à homofobia, a esquerda e a direita confundem-se como uma única entidade devastada pelo preconceito e a estupidez. Não só a Igreja Católica e as seitas evangélicas repudiam o homossexual e opõem-se obstinadamente ao matrimônio de gays. Os dois movimentos subversivos que nos anos 80 iniciaram a rebelião armada para instalar o comunismo no Peru, o Sendero Luminoso e o MRTA - Movimento Revolucionário Tupac Amaru - executavam os homossexuais de maneira sistemática nos povoados que controlavam para libertar a sociedade de semelhante praga.

Libertar a América Latina dessa tara ancestral que são o machismo e a homofobia - as duas faces da mesma moeda - será demorado e difícil, e provavelmente o caminho até essa libertação estará repleto de muitas outras vítimas semelhantes ao desventurado Daniel Zamudio. O tema não é político, mas religioso e cultural. Fomos acostumados desde tempos imemoriais à ideia de que existe uma ortodoxia sexual da qual apenas os pervertidos, os loucos e enfermos se afastam e vimos transmitindo esse absurdo monstruoso para nossos filhos, netos e bisnetos, auxiliados pelos dogmas da religião, os códigos morais e os hábitos instaurados. Temos medo do sexo e nos custa aceitar que, neste incerto domínio, há opções e variantes que devam ser aceitas como manifestações da diversidade humana. Nesse aspecto da condição de homens e mulheres deve reinar a liberdade, permitindo que na vida sexual cada um escolha sua conduta e vocação sem outra limitação senão o respeito e a aquiescência do próximo.

Minorias começam a aceitar que uma lésbica ou um gay são pessoas tão normais como um heterossexual e, portanto, devem ter os mesmos direitos - como contrair matrimônio e adotar filhos -, mas ainda hesitam em lutar em favor das minorias sexuais porque sabem que, para vencer, é necessário mover montanhas, lutar contra um peso morto que nasce na rejeição primitiva do "outro", daquele que é diferente, pela cor de sua pele, seus hábitos, sua língua e suas crenças, que é a fonte que nutre as guerras, os genocídios e os holocaustos que enchem a história da humanidade de sangue e de cadáveres.

Sem dúvida, avançamos muito na luta contra o racismo, mas não o extirpamos totalmente. Hoje, pelo menos, sabemos que não se deve discriminar ninguém e é de mau gosto alguém se proclamar racista. Mas nada disso existe no que se refere a gays, lésbicas e transexuais. Quanto a eles, podemos desprezar e maltratar impunemente. Eles são a demonstração mais reveladora de quão distante boa parte do mundo ainda está da verdadeira civilização. 

Mário Vargas Llosa é um dos mais renomados escritores latino-americanos, ganhador do prêmio Nobel de Literatura em 2010
La Caza del Gay

La noche del tres de marzo pasado, cuatro “neonazis” chilenos, encabezados por un matón apodado Pato Core, encontraron tumbado en las cercanías del Parque Borja, de Santiago, a Daniel Zamudio, un joven y activista homosexual de 24 años, que trabajaba como vendedor en una tienda de ropa.

Durante unas seis horas, mientras bebían y bromeaban, se dedicaron a pegar puñetazos y patadas al maricón, a golpearlo con piedras y a marcarle esvásticas en el pecho y la espalda con el gollete de una botella. Al amanecer, Daniel Zamudio fue llevado a un hospital, donde estuvo agonizando durante 25 días al cabo de los cuales falleció por traumatismos múltiples debidos a la feroz golpiza.

Este crimen, hijo de la homofobia, ha causado una viva impresión en la opinión pública no sólo chilena, sino sudamericana, y se han multiplicado las condenas a la discriminación y al odio a las minorías sexuales, tan profundamente arraigados en toda América Latina. El presidente de Chile, Sebastián Piñera, reclamó una sanción ejemplar y pidió que se activara la dación de un proyecto de ley contra la discriminación que, al parecer, desde hace unos siete años vegeta en el Parlamento chileno, retenido en comisiones por el temor de ciertos legisladores conservadores de que esta ley, si se aprueba, abra el camino al matrimonio homosexual.

Ojalá la inmolación de Daniel Zamudio sirva para sacar a la luz pública la trágica condición de los gays, lesbianas y transexuales en los países latinoamericanos, en los que, sin una sola excepción, son objeto de escarnio, represión, marginación, persecución y campañas de descrédito que, por lo general, cuentan con el apoyo desembozado y entusiasta del grueso de la opinión pública.

Lo más fácil y lo más hipócrita en este asunto es atribuir la muerte de Daniel Zamudio sólo a cuatro bellacos pobres diablos que se llaman neonazis sin probablemente saber siquiera qué es ni qué fue el nazismo. Ellos no son más que la avanzadilla más cruda y repelente de una cultura de antigua tradición que presenta al gay y a la lesbiana como enfermos o depravados que deben ser tenidos a una distancia preventiva de los seres normales porque corrompen al cuerpo social sano y lo inducen a pecar y a desintegrarse moral y físicamente en prácticas perversas y nefandas.

Esta idea del homosexualismo se enseña en las escuelas, se contagia en el seno de las familias, se predica en los púlpitos, se difunde en los medios de comunicación, aparece en los discursos de políticos, en los programas de radio y televisión y en las comedias teatrales donde el marica y la tortillera son siempre personajes grotescos, anómalos, ridículos y peligrosos, merecedores del desprecio y el rechazo de los seres decentes, normales y corrientes. El gay es, siempre, “el otro”, el que nos niega, asusta y fascina al mismo tiempo, como la mirada de la cobra mortífera al pajarillo inocente.

En semejante contexto, lo sorprendente no es que se cometan abominaciones como el sacrificio de Daniel Zamudio, sino que éstas sean tan poco frecuentes. Aunque, tal vez, sería más justo decir tan poco conocidas, porque los crímenes derivados de la homofobia que se hacen públicos son seguramente sólo una mínima parte de los que en verdad se cometen. Y, en muchos casos, las propias familias de las víctimas prefieren echar un velo de silencio sobre ellos, para evitar el deshonor y la vergüenza.

Aquí tengo bajo mis ojos, por ejemplo, un informe preparado por el Movimiento Homosexual de Lima, que me ha hecho llegar su presidente, Giovanny Romero Infante. Según esta investigación, entre los años 2006 y 2010 en el Perú fueron asesinadas 249 personas por su “orientación sexual e identidad de género”, es decir una cada semana. Entre los estremecedores casos que el informe señala, destaca el de Yefri Peña, a quien cinco “machos” le desfiguraron la cara y el cuerpo con un pico de botella, los policías se negaron a auxiliarla por ser un travesti y los médicos de un hospital a atenderla por considerarla “un foco infeccioso” que podía transmitirse al entorno.

Estos casos extremos son atroces, desde luego. Pero, seguramente, lo más terrible de ser lesbiana, gay o transexual en países como Perú o Chile no son esos casos más bien excepcionales, sino la vida cotidiana condenada a la inseguridad, al miedo, la conciencia permanente de ser considerado (y llegar a sentirse) un réprobo, un anormal, un monstruo. Tener que vivir en la disimulación, con el temor permanente de ser descubierto y estigmatizado, por los padres, los parientes, los amigos y todo un entorno social prejuiciado que se encarniza contra el gay como si fuera un apestado. ¿Cuántos jóvenes atormentados por esta censura social de que son víctimas los homosexuales han sido empujados al suicidio o a padecer de traumas que arruinaron sus vidas? Sólo en el círculo de mis conocidos yo tengo constancia de muchos casos de esta injusticia garrafal que, a diferencia de otras, como la explotación económica o el atropello político, no suele ser denunciada en la prensa ni aparecer en los programas sociales de quienes se consideran reformadores y progresistas.

Porque, en lo que se refiere a la homofobia, la izquierda y la derecha se confunden como una sola entidad devastada por el prejuicio y la estupidez. No sólo la Iglesia católica y las sectas evangélicas repudian al homosexual y se oponen con terca insistencia al matrimonio homosexual. Los dos movimientos subversivos que en los años ochenta iniciaron la rebelión armada para instalar el comunismo en el Perú, Sendero Luminoso y el MRTA (Movimiento Revolucionario Tupac Amaru), ejecutaban a los homosexuales de manera sistemática en los pueblos que tomaban para liberar a esa sociedad de semejante lacra (ni más ni menos que lo hizo la Inquisición a lo largo de toda su siniestra historia).

Liberar a América Latina de esa tara inveterada que son el machismo y la homofobia —las dos caras de una misma moneda— será largo, difícil y probablemente el camino hacia esa liberación quedará regado de muchas otras víctimas semejantes al desdichado Daniel Zamudio. El asunto no es político, sino religioso y cultural. Fuimos educados desde tiempos inmemoriales en la peregrina idea de que hay una ortodoxia sexual de la que sólo se apartan los pervertidos y los locos y enfermos, y hemos venido transmitiendo ese disparate aberrante a nuestros hijos, nietos y bisnietos, ayudados por los dogmas de la religión y los códigos morales y costumbres entronizados. Tenemos miedo al sexo y nos cuesta aceptar que en ese incierto dominio hay opciones diversas y variantes que deben ser aceptadas como manifestaciones de la rica diversidad humana. Y que en este aspecto de la condición de hombres y mujeres también la libertad debe reinar, permitiendo que, en la vida sexual, cada cual elija su conducta y vocación sin otra limitación que el respeto y la aquiescencia del prójimo.

Las minorías que comienzan por aceptar que una lesbiana o un gay son tan normales como un heterosexual, y que por lo tanto se les debe reconocer los mismos derechos que a aquél —como contraer matrimonio y adoptar niños, por ejemplo— son todavía reticentes a dar la batalla a favor de las minorías sexuales, porque saben que ganar esa contienda será como mover montañas, luchar contra un peso muerto que nace en ese primitivo rechazo del “otro”, del que es diferente, por el color de su piel, sus costumbres, su lengua y sus creencias y que es la fuente nutricia de las guerras, los genocidios y los holocaustos que llenan de sangre y cadáveres la historia de la humanidad.

Se ha avanzado mucho en la lucha contra el racismo, sin duda, aunque sin extirparlo del todo. Hoy, por lo menos, se sabe que no se debe discriminar al negro, al amarillo, al judío, al cholo, al indio, y, en todo caso, que es de muy mal gusto proclamarse racista.

No hay tal cosa aún cuando se trata de gays, lesbianas y transexuales, a ellos se los puede despreciar y maltratar impunemente. Ellos son la demostración más elocuente de lo lejos que está todavía buena parte del mundo de la verdadera civilización.

Vai melhorar! Dando esperança aos jovens LGBT que sofrem com o bullying

quarta-feira, 18 de abril de 2012 0 comentários

contra o bullying homofóbico
Em setembro de 2010, o escritor e colunista Dan Savage e seu companheiro Terry Miller criaram um vídeo no YouTube para dar esperança aos jovens LGBT que sofrem com abusos em qualquer lugar, sobretudo na escola, onde casos de adolescentes que até se suicidam, por não suportar o bullying homofóbico, não são raros. 

Eles quiseram criar uma forma pessoal e coletiva de apoio a esses jovens, através de depoimentos de pessoas que também passaram pelas agruras do preconceito, mas conseguiram superá-lo e sobreviver. Deram, então, ao projeto, o nome de Vai melhorar (It gets better).

O projeto deu tão certo que se multiplicou em várias versões, expandindo-se para o depoimento de políticos, celebridades, atravessando os continentes e sendo adaptado para vários idiomas. No Brasil, levou o nome de Não Gosto dos Meninos (ver abaixo). 

Agora, surgiu mais um dos frutos dessa boa ideia na forma de depoimentos de atletas, de diferentes modalidades, da Universidade de Nova York (NYU). 

Segue abaixo esse vídeo, no original, mais três outros já legendados em português (inclui uma versão do Trevor Project, projeto análogo ao do It gets Better) e a versão brasileira do Vai Melhorar. Para mais informações e vídeos, acesse o site do projeto. Destaque, entre os vídeos legendados, para os depoimentos do elenco e do diretor da série True Blood.

E que ninguém duvide: tudo muda mesmo, e a melhor vingança é ser feliz. Os preconceituosos sempre ladram, mas a caravana passa. 









Casal gay foi à luta contra SENAC por igualdade de direitos

terça-feira, 17 de abril de 2012 3 comentários

Elvis e Aparecido (Foto: Flavio Moraes/G1)
Elvis Lincoln Nunes, 36, agente administrativo no Serviço Social de Aprendizagem Comercial (Senac-SP), pediu o benefício da licença-gala (três dias de folga - no SENAC, sete - a que o trabalhador formal tem direito nessa ocasião) para passar a Semana Santa em viagem de lua de mel com seu o companheiro, o operador de telemarketing Aparecido Cordeiro Brito, 37.

Entretanto, O SENAC não concedeu a licença, alegando que ainda estava se adaptando burocraticamente ao reconhecimento da união estável homossexual. Sentindo-se discriminado, Elvis recorreu ao Centro de Combate à Homofobia (CCH), vinculado à Coordenadoria de Assuntos da Diversidade Sexual (Cads) da Prefeitura de São Paulo para abrir um processo administrativo pedindo punição por discriminação.

Procurou também o advogado trabalhista, Haroldo Del Rei Almendro, que entrou na Justiça com uma reclamação, pedindo e conseguindo, em menos de 24 horas, a tutela antecipada (que adianta o gozo do benefício), ou seja, a licença requerida.

Fica aí a dica: em caso de discriminação no trabalho, um advogado trabalhista pode obter seus direitos rapidamente, determinando a igualdade de todos perante a lei, o chamado princípio da isonomia, princípio básico de todas as democracias.

Fonte: com informações do G1

Candidatos à presidência na França aparecem como filhos de casais LGBT em campanha de sensibilização

segunda-feira, 16 de abril de 2012 0 comentários


Para divulgar campanha pelo reconhecimento das famílias homoparentais, A ONG francesa SOS Homophobie apresentou fotos-montagem onde mostra os principais candidatos à eleição presidencial francesa como se fossem filhos de casais homossexuais. Na legenda de um dos cartazes, lê-se: "Nicolas (Sarkozy) também poderia ter tido duas mamães lésbicas (...)Ele também teria sido feliz".

Segundo a ONG, que existe há 18 anos, as cerca de 300 mil crianças, criadas por pais homossexuais, não têm os mesmos direitos das demais crianças, daí a importância da campanha de sensibilização sobre o assunto que continuará, independentemente do resultado das votações nos próximos dias 22 de abril e 6 de maio.

Fontes: com informações de Jornal Floripa e do site da SOS Homophobie

Homofobia: por um conceito amplo ou restrito?

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arco-íris
Autor(a): Míriam Martinho

Dizem os estudiosos que vivemos há pelo menos 5000 anos no sistema patriarcal, assentado na supremacia masculina, com os homens como figuras detentoras de autoridade e privilégios, na sociedade, em detrimento das mulheres. Esse sistema, por sua vez, assenta-se na família patriarcal e na heterossexualidade obrigatória, tida como única forma "normal" de relacionamento erótico e afetivo entre as pessoas. Embora ligeiramente abalado do último século para cá, com a mudança no estatuto das mulheres e as reivindicações de grupos homossexuais por igualdade de direitos, este sistema continua vigente e permeia tudo que nos circunda, inclusive nós mesmos. Então, seríamos obrigados, ao fazer uma leitura radical desse contexto, a considerar tudo como sexista e heterossexista e consequentemente preconceituoso, o que é inviável.

Por isso, na minha opinião, o conceito de homofobia necessita de definição precisa, objetiva, com a qual a sociedade concorde, para ser passível de se tornar crime. Sem uma definição dessa natureza, ficamos à mercê das subjetividades, e cada um(a) vê e sente as coisas de uma forma, tanto que aquilo que me ofende não ofende igualmente a outra pessoa ou sequer a ofende. Obviamente, me refiro aos casos, tidos como preconceituosos, de anúncios comerciais, declarações de celebridades, entre outros mais light, e não a crimes de ódio, mesmo porque o estudo desses crimes estabelecerá sua motivação, possibilitando separar-se o joio do trigo. Assim, considero fundamental haver, na análise de qualquer situação de homofobia, pelo menos um sujeito homossexual presente e/ou referências (negativas) incontestáveis à homossexualidade. Fora dessas especificações, pondero que entramos no terreno das especulações subjetivas, um verdadeiro pântano, onde se atolar é muito fácil.

Sobretudo, vejo o patrulhamento ideológico das pequenas falas, realizado por muitos ativistas homossexuais hoje em dia, como profundamente contraproducente à luta pelos direitos LGBT, pois cria antagonismos desnecessários e passa uma imagem de fanatismo da militância. O objetivo a conquistar é o da igualdade de todos perante a lei, via a oficialização dos direitos civis das pessoas homossexuais e, no máximo, o do reconhecimento da homossexualidade, da bissexualidade, etc., como variantes da sexualidade humana, pois é o que são aliás.

Fora isso, me parece extrapolação da função do ativismo - e fonte da oposição ao alcunhado kit antihomofobia, por exemplo - sair-se pregando contra a heteronormatividade, entendida pela maioria como heterossexualidade simplesmente. A maior parte das pessoas acha que combater a norma heterossexual - pelo seu caráter de obrigatoriedade - é o mesmo que combater a heterossexualidade. Daí não precisa um grande salto intelectual para imaginar que se quer fazer propaganda da homossexualidade, em programas de educação sexual, em vez de simplesmente combater o preconceito contra a mesma. Há formas e formas de se dizer e fazer as coisas. Impor conceitos e jargões do ativismo à sociedade só gera confusões.

Parodiando Martin Luther King, prefiro pensar que um mundo justo será simplesmente aquele onde as pessoas não serão julgadas por detalhes insignificantes como a cor da pele, o sexo ou a orientação sexual e sim pelo conteúdo de seu caráter. Não quero substituir uma norma por outra, preconceituosos heterossexuais por preconceituosos homossexuais. Melhor construir pontes do que levantar muros.

Nota: Aproveito para convidá-los a ler dois textos sobre direitos homo de uma perspectiva liberal, com a qual me identifico em boa parte:União homoafetiva: uma pequena vitória para a liberdade:http://bit.ly/iCpBV0 União estável, homofobia e igualdade de direitos:http://bit.ly/k9ZzAz

Publicado originalmente em Contra o Coro dos Contentes (14/06/11)  

American Airlines: Viagens para gays e lésbicas

sexta-feira, 13 de abril de 2012 0 comentários

dCasal de mulheres e criança
 Casal de mulheres e criança no site da American Airlines

Durante a abertura da convenção anual de 29ª International Gay & Lesbian Travel Association (www.iglta.org), em Florianópolis, hoje, 13/04, a diretora da American Airlines de Mercados de Diversidade, Cynthia Barnes, anunciou que o site da empresa, para o público LGBT, agora também está acessível em Português e Espanhol. 

Nele, os interessados poderão ler que a American Airlines se orgulha de ter o primeiro programa de fidelidade de companhias aéreas que convida você a marcar LGBT no seu perfil do passageiro. Informa também que promoções e serviços são personalizados levando em consideração as suas necessidades.

Para mais informações a respeito das propostas da companhia, as pessoas podem assinar o Boletim Informativo Rainbow, enviado por e-mail, ou ainda acessar a página da AA no Facebook ou segui-la pelo Twitter. A AA tem inclusive equipe de recursos humanos dedicada ao público LGBT, a GLEAM.

Clipping: Londres proíbe anúncio que oferece 'cura para gays'

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Anúncio de entidade de defesa dos
direitos gays... (Foto: Stonewall)
As autoridades de transporte de Londres proibiram um anúncio veiculado nos ônibus da cidade que sugeria que gays poderiam ser curados.

A campanha, uma paródia de uma iniciativa do grupo pró-gay Stonewall ('Algumas pessoas são gays. Aceite isso'), afirma que terapias poderiam mudar a orientação sexual.

Com o enunciado 'Não gay! Pós-gay, ex-gay e orgulhoso. Aceite isso!', a campanha seria veiculada nos ônibus na próxima semana.

... e sua paródia (Foto: Core Issues Trust)
e sua paródia (Foto: Core Issues Trust)




Mas a autoridade de transporte londrina, Transport for London (TfL), baniu o anúncio após reclamações.

'Tolerante e inclusiva'

A Core Issues Trust, grupo cristão que está por trás da campanha banida, afirmou que a decisão constitui censura. O TFL, no entanto, argumentou que os anúncios não refletiam uma Londres 'tolerante e inclusiva'.

'Os anúncios não estão nem estarão em qualquer dos ônibus da cidade', disse um porta-voz da autoridade.

Desde abril, 1.000 ônibus londrinos exibem os anúncios promovendo o casamento entre pessoas do mesmo sexo, a campanha 'Algumas pessoas são gays. Aceite isso'.

Já os pôsteres bancados pela entidade cristã Anglican Mainstream e contratados junto às empresas de ônibus pelo grupo cristão Core Issues seriam veiculados em cinco rotas centrais de ônibus, incluindo destinos altamente turísticos e centrais como a Catedral de St Paul, Oxford Street, Trafalgar Square e Piccadilly Circus.

'Canais corretos'

O porta-voz da Stonewall, Andy Wasley, ressaltou que 'não há anúncios promovendo vudu para curar gays em Londres', em uma crítica às entidades cristãs.

O prefeito Boris Johnson afirmou: 'É claramente ofensivo sugerir que ser gay é uma doença da qual as pessoas se recuperam e não estou disposto a ver isso circulando nos ônibus da cidade'.

Já o co-diretor da Core Issues Mike Davidson afirmou não ter se dado conta de que a censura estava em vigor na capital. 'Usamos todos os canais corretos e fomos aconselhados pelas empresas de ônibus a seguir seus procedimentos. Eles nos deram OK e, agora, vetaram'.

Fonte: G1

Atriz Guta Stresser participa da Campanha Nacional de Apoio Casamento Civil Igualitário

quinta-feira, 12 de abril de 2012 0 comentários

casamento igualitário
Guta Stresser (atriz)
Guta Stresser é uma das artistas, entre vários outros artistas, que gravou depoimento para a campanha pelo casamento civil igualitário que se inicia agora. Vejam que ótima a fala da artista.

O projeto do casamento civil para pessoas de mesmo sexo é de autoria do deputado Jean Wyllys (PSOL).


Luiz Carlos Lacerda (BIGODE) Participa da Campanha de apoio ao Casamento Civil Igualitário

quarta-feira, 11 de abril de 2012 0 comentários

casamento Igualitário
Cineasta Luiz Carlos Lacerda
Luiz Carlos Lacerda é um dos artistas, entre vários outros, que gravou depoimento para a campanha pelo casamento civil igualitário que se inicia em 2 dias. Vejam que ótima a fala do artista.

O projeto do casamento civil para pessoas de mesmo sexo é de autoria do deputado Jean Wyllys (PSOL).

Sérgio Loroza Participa da Campanha de apoio ao Casamento Civil Igualitário

terça-feira, 10 de abril de 2012 0 comentários

casamento igualitário
Sérgio Loroza é um dos artistas, entre vários outros, que gravou depoimento para a campanha pelo casamento civil igualitário que se inicia em 2 dias. Vejam que ótima a fala do artista.

O projeto do casamento civil para pessoas de mesmo sexo é de autoria do deputado Jean Wyllys (PSOL).

Quais as cidades mais lesbianas do Brasil?

segunda-feira, 9 de abril de 2012 0 comentários

Av. Paulista
São Paulo (Av. Paulista), a mais lesbiana

1.
Sampa foi considerada a cidade mais amigável para as lesbianas leitoras do site Um Outro Olhar. Seguida das cidades do/de:
2. Rio de Janeiro
3. Belo Horizonte
4. Florianópolis, Recife e Salvador

Veja os critérios da votação na postagem As vinte e uma cidades mais lesbianas dos EUA. E no Brasil?
E abaixo os votos que cada cidade brasileira listada recebeu em nossa enquete.

Quais as cidades mais lesbianas do Brasil?
Belo Horizonte   16,33% (40 votos)
Florianópolis       5,71% (14 votos)
Recife                5,71% (14 votos)
Rio de Janeiro    17,55% (43 votos)
Salvador            5,71% (14 votos)
São Paulo          48,98% (120 votos)
Total: 245 votos

Obrigada por votar. E responda nossa nova enquete: Se tivesse que optar apenas por um dos projetos abaixo, qual escolheria? Casamento civil ou Contra a Homofobia?

Cordéis contra o preconceito

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cordel
Salete Maria
Entrevista com Salete Maria, do blog Cordelirando, sobre seus cordéis inovadores que atacam a homofobia

UOO: Salete, primeiro fale um pouco de você: sua idade, etnia,  sua profissão, formação, cidade onde vive, se é casada ou solteira, etc.
Salete Maria (SM): Sou Salete Maria, cordelista, brasileira. Moro em Juazeiro do Norte, Ceará, cidade considerada a Meca do Sertão em face da figura mítica do Padre Cícero Romão Batista. Nasci em São Paulo por força de um problema social muito sério: o desemprego que, agravado pela seca, assolou o nordeste do país e tangeu meus pais, assim como seus conterrâneos, para o sudeste em busca de “uma vida melhor”. Toda minha ascendência é nordestina. Sou bisneta de romeiros pernambucanos, neta de cearenses analfabetos e filha de resistentes sociais. Meu pai é um lavrador que em São Paulo virou pedreiro e minha mãe é uma camponesa que em São Paulo foi faxineira. Vim ao mundo em 1969, mais precisamente no dia 7 de março. Tenho cinco irmãos e uma filha. Sou advogada, professora universitária e militante de direitos humanos.  Por conta da minha história de vida, desenvolvi a compreensão de que o direito se constrói nas lutas sociais, com muita peleja e poesia. Defendo o pluralismo jurídico e literário e coloco minha formação e minha arte a serviço das causas dos excluídos e marginalizados. Sou solteira e atualmente desenvolvo estudos sobre gênero e direito, em nível de doutorado, na Universidade Federal da Bahia, em Salvador. Escrevo contos, poemas e, sobretudo, cordéis.  

UOO:  Fale um pouco sobre o cordel: sua origem, suas características, seus principais expoentes. 
SM: Eu não conheço consenso acerca da origem da literatura de cordel. Muitos afirmam que é de origem européia. Todavia, já ouvi “vozes sábias” dizerem que esta literatura já existia  desde a época dos povos conquistadores de origem greco-romana; havendo chegado, por volta do século XVI, a península ibérica, mais precisamente a Espanha e Portugal. Nestes lugares este tipo de literatura recebia o nome de “pliegos sueltos”, “folhas soltas” ou “volantes”. Aqui no Brasil o cordel chega com os colonizadores e se instala, primeiramente, na Bahia, em Salvador, e depois se expande para o resto do nordeste.

Muitos sustentam que a característica fundamental do cordel é o fato de ele ser uma espécie de poesia popular, impressa e divulgada em folhetos ilustrados com xilogravura. Todavia, já existem controvérsias sobre isto, uma vez que este “popular” é bastante discutível, sendo também possível a utilização de outras formas de ilustração, tais como desenhos e clichês grafados em zinco, por exemplo.

Dizem que o cordel ganhou este nome porque os folhetos eram expostos amarrados em cordões, estendidos em pequenas lojas de mercados populares ou até mesmo nas ruas, em Portugal.  O  custo do cordel, tal como foi e ainda é produzido, é bastante baixo, comparado com o custo de outras literaturas. Ademais, geralmente estes folhetos são vendidos pelos próprios autores. O cordel ainda goza de um certo prestígio em estados como Pernambuco, Ceará, Alagoas, Paraíba e Bahia. Dizem que tal sucesso é atribuído ao baixo preço e ao tom jocoso presente na narrativa da maioria dos trabalhos. Em geral, os temas tratam de fatos que vão desde a vida cotidiana até grandes fenômenos como secas, cangaço, religiosidade, heroísmo, milagres, festas, política, disputas, etc. Todavia, já existem cordelistas no Brasil discutindo e re-significando este tipo de literatura, inclusive propondo uma crítica ao cordel tradicional, como é o caso da Sociedade dos Cordelistas Mauditos, da qual eu faço parte.

cordelQuanto ao modo de apresentação, ainda é possível se encontrar cordéis sendo acompanhados pela viola em recitais públicos, porém em menor quantidade.
Quanto aos ditos expoentes, pode se dizer que os livros e pesquisas sobre cordel, em consonância com outras formas de historiografia, confere maior visibilidade aos poetas homens, uma vez que a maioria dos entendidos e experts neste campo só destaca os grandes vates, dando a entender que não existem mulheres cordelistas no mundo do folheto. E isto também se reproduz na fala e na prática de muitos amantes do cordel ou até mesmo de respeitados e reconhecidos  produtores deste gênero literário. Uma prova disto é o fato de que a Academia Brasileira de Literatura de Cordel, sediada no Rio de Janeiro registra entre os “imortais” ocupantes das 40 cadeiras, apenas seis mulheres, cuja produção, no meu entender, se apresenta num tom bastante favorável à manutenção deste status quo; valendo destacar que no estatuto desta Academia, apenas 25% de suas cadeiras estão reservadas a não-moradores da capital carioca, ou seja, não há apenas um desequilíbrio na representatividade feminina, há também uma exclusão de ordem geopolítica que impossibilita o ou a cordelista da margem de ser reconhecido pelo cânone.

Sobre os grandes nomes, se você perguntar a qualquer pesquisador ou mesmo cordelista “bem informado”, vão dizer que o poeta da literatura de cordel que fez mais sucesso até hoje foi Leandro Gomes de Barros (1865-1918), que deve ter escrito mais de mil folhetos. 

No entanto, existem muitos poetas por este Brasil afora, mormente no nordeste do país, com excelentes produções, porém ainda sem oportunidade de apresentar seu trabalho. 

UOO: O cordel é uma expressão artística tipicamente nordestina, mas também se encontram cordelistas em outras partes do Brasil. Quais seriam e quem são os artistas mais conhecidos.SM: No Brasil, realmente, o cordel tem sido mais produzido no nordeste, onde ele chegou primeiro, se instalou e encontrou um ambiente fértil para sua expansão e apreciação. Pernambuco, Paraíba e Ceará se destacam entre os estados onde sua presença é mais forte. No Ceará, a região do Cariri, onde eu moro, é um verdadeiro celeiro de produção de literatura de Cordel. É na cidade de Juazeiro onde ainda existe em pleno (porém difícil) funcionamento a Gráfica Lira Nordestina, grande patrimônio e rico legado da produção de cordel no país.

Por outro lado, e sobretudo por conta do êxodo, das diásporas às quais já me referi, o cordel segue sendo apreciado e confeccionado em outros cantos do país. Em estados como São Paulo, Rio de Janeiro e Minas é possível encontrar cordel em espaços e feiras de produtos nordestinos.

Como disse, são mais conhecidos os cordelistas homens, havendo sempre o destaque nas diversas obras sobre a temática para poetas como Leandro Gomes de Barros (1865-1918) e João Martins de Athayde (1880-1959), enquanto precursores. As obras em geral e a imprensa oficial têm dado destaque ainda, dentre tantos, aos seguintes nomes: o baiano Antonio Teodoro dos Santos (1916), o pernambucano Apolônio Alves dos Santos (1926); o cearense Arievaldo Viana Lima (1967); o paraibano Cícero Vieira da Silva (1936); o pernambucano Caetano Cosme da Silva (1927); o alagoano Enéias Tavares dos Santos (1932), o paraibano Francisco das Chagas Batista (1882); o pernambucano Francisco de Souza Campos (1926); o paraibano Francisco Firmino de Paula (1911); o paraibano Francisco Sales de Arêda (1916), o pernambucano Inácio Carioca (1932), o pernambucano Jota Barros (1935), o baiano João Damasceno Nobre (1910); o sergipano João Firmino Cabral (1940), o alagoano João Gomes de Sá; o cearense João Lucas Evangelista (1937); o paraibano João Melchiades Ferreira da Silva (1869); o paraibano Jose Camelo Resende, o pernambucano José João dos Santos, conhecido como mestre Azulão, o pernambucano Zé Pacheco, o pernambucano Manoel Monteiro, o baiano Minelvino Francisco Silva, o paraibano Silvino Pirauá, dentre outros. Eu, particularmente li e bebi muito nestas fontes e tenho muito apreço e devoção por Patativa do Assaré. 

Todavia, já existem importantes estudos acadêmicos sobre a produção feminina na literatura de cordel, merecendo destaque a pesquisa da professora da Universidade Federal do Ceará, campus Cariri, Francisca Pereira dos Santos, (Fanka) que também é cordelista e tem  trabalhos publicados sobre  esta questão. Esta pesquisadora já cataloga mais de 30 mulheres produtoras, sendo que a maioria delas mora no nordeste do país. Em sua obra intitulada Romaria de Versos sobre mulheres cearenses autoras de cordel, ela destaca as poetisas Arlene Holanda, Mana, Josenir Lacerda, Maria Anilda, Maria do Rosário, Maria Ivonete, Maria Luciene, Maria Matilde, Maria Vânia, Bastinha e eu. 

Com vistas também a provocar um debate sobre este problema há um cordel meu intitulado MULHER TAMBÉM FAZ CORDEL, que pode ser acessado em nosso blog. Neste cordel contamos a história do início da produção escrita de cordel pelas mulheres no Brasil, mostrando que a primeira a publicar um folheto teve que assinar com pseudônimo masculino, nas primeiras décadas do século passado. Todavia, como as maioria das mulheres fora condenada ao analfabetismo por muito tempo, isto não quer dizer que elas não faziam poesia. Minha avó mesmo, como já disse, sempre recitou e sempre criou, porém no campo da oralidade, já que este era o seu único e possível lugar de manifestação.

cordel
 Existem muitas mulheres escrevendo cordel hoje no Brasil, dentre as quais eu me incluo e sou apresentada como um diferencial, mas não apenas por ser uma mulher escrevendo cordel, mas por ser uma mulher que escreve cordel sobre temáticas femininas, inclusive visibilizando, por este veículo, as mulheres lésbicas.

UOO: Agora nos fale um pouco sobre como se envolveu com cordel.
SM: Bom, eu sou neta de D. Maria José e sobrinha de Zé Alexandre. Ela poeta, cordelista, cega e analfabeta que “dizia” sua poesia e a de outras pessoas que ela escutou durante a toda a vida. Faleceu aos noventa anos, em 2003, sem nunca ter aprendido a ler ou escrever. Foi a primeira mulher a fazer versos que eu conheci. Escutei muito ela recitar. Li muitos cordéis pra ela também.
Meu tio Zé Alexandre mora também em Juazeiro do Norte, é um grande poeta, faz rimas primorosas e muito me influenciou com seus rabiscos e sua sensibilidade poética, já que ele quase não publica. Sempre li para meus parentes da zona rural que, em regra, ou não sabiam ler ou liam muito pouco, e tinham na literatura de cordel uma atividade de deleite ou mesmo um veículo de notícias. Comecei lendo, depois fui produzindo e hoje tenho vários títulos publicados e dois deles premiados.

UOO: Quantos cordéis você já compôs e onde os divulga, além de por seu blog Cordelirando? 
SM:   Tenho mais de quarenta cordéis publicados. Mas tenho muito mais compostos. Nem sempre posso publicar. Nem sempre publico logo que escrevo. Costumo divulgar nos eventos, faço doação para pesquisadores, admiradores e outros cordelistas. Nunca escrevi pensando que as pessoas pudessem apreciar o meu texto porque é um texto muitas vezes polêmico, carregado de paixão e luta, muito intertextual. Através do meu cordel eu dialogo com várias outras literaturas e formas de arte. Escrevo também cordel pensando na música, na cantoria e no teatro, enfim. Tenho o blog intitulado Cordelirando onde publico desde 2007. É um espaço de divulgação.

Mas eu gosto muito também do cordel impresso, da capa, do formato, enfim, da estética real. Recentemente uma grande cantora paraibana, chamada Socorro Lira, resolveu, estimulada por duas grandes amigas em comum, musicar meu cordel intitulado MARIA DE ARAÚJO E SEU LUGAR NA HISTÓRIA (ou a Beata Beat Cult). Este meu cordel trata da história de uma beata lá de Juazeiro do Norte que ao receber a hóstia em comunhão protagonizou um “milagre” que fez com que o Padre Cícero se tornasse o grande taumaturgo do nordeste.

O fato é que a beata fora secundarizada na história, e eu busco narrar o acontecido, num texto teatral irônico, provocativo, dramático, que mistura bendito e embolada, dando visibilidade a esta mulher que era e ainda é um ser marginal na grande história da minha terra. Pois bem. Socorro Lira, ao musicar este cordel, sob a direção da baiana Gal Meirelles, gravou um DVD que vai ser lançado até o final deste ano, junto com uma coletânea de 8 cordéis meus. O projeto recebe o título de dois outros cordéis meus: CORDELIRANDO e MULHER TAMBÉM FAZ CORDEL.

Além disto, atores juazeirenses, tais como Joaquina e André de Andrade têm feito leituras dramáticas do meu trabalho, com apresentação pública em projetos patrocinados pelo Banco do Nordeste do Brasil-BNB. A poetisa potiguar Dath Haak   também recitou e disponibilizou na internet três dos meus cordéis, dentre eles Lesbecause e do Direito de ser gay.  Eu mesma, apesar da timidez, sempre recito em rodas de amigos e às vezes antes de ministrar algumas palestras.

UOO: Qual o tema principal de seus cordéis? E quanto eles se diferenciam dos cordéis tradicionais?
SM:   Veja, no ano 2000 foi criada a Sociedade dos Cordelistas Mauditos, em Juazeiro do Norte. Esta turma é composta por jovens poetas de grande entusiasmo. Integrei esta Sociedade desde o seu nascedouro. Mas antes disto, desde 1996, eu já publicava. Escrevo há bastante tempo. Tenho cordéis sobre variados temas. Na sua totalidade são sobre questões marginais e periféricas. A maioria sobre mulheres, relações de gênero, homossexualidade, cidadania e afins. Também já falei de assédio moral, velhice, analfabetismo, violência, saúde, política, etc. Mas a temática preferencial é a das mulheres e homossexuais. 

Antes de ser da Sociedade, eu já falava das temáticas que os cordelistas mauditos abordam. Pensamos que a diferença entre nós e os ditos tradicionais se dá tanto na forma quanto no conteúdo. Na forma, inovamos com a capa, que além da xilogravura usamos colagens, desenho, foto, etc. E às vezes ilustramos até as folhas internas do cordel. No conteúdo, procuramos abordar de modo crítico, denunciativo, propositivo e emancipatório questões que os cordéis tradicionais tratam no sentido de manter o status quo. Demonstramos a questão da violência contra a mulher, do discurso homofóbico, machista, racista, sexista presente em muitos dos clássicos da literatura de cordel.

Atualmente nossa ‘sociedade’ tá meio dispersa porque os cordelistas precisam trabalhar para sobreviver, mas mesmo assim eu gosto de destacar o valor dos meus colegas. Poetas como Hélio Ferraz, Fanka, Soneca, Batata, Orivaldo, Nicodemos, dentre outros, são os poetas ditos mauditos do Cariri. E são muito bons. Logicamente que de tão mauditos têm divergências entre si, mas isto faz parte da proposta. Eu tenho sido a que mais tem produzido e a que antes da sociedade já tinha este espírito de poesia social e crítica. Fizemos um manifesto que dizia mais ou menos assim: A nossa comunicação se dá através da poesia de cordel, traço da nossa identidade nordestina. Odiamos tecnicistas sem sentimentos literários. Somos contra o lugar comum da globalização que cria signos massificantes e uniformiza o comportamento estético. Nosso movimento movimento pretende, sob uma ótica intertextual, utilizando vários códigos estéticos, redimensionar a literatura de cordel para um campo onde todas as linguagens sejam possíveis. Não somos nem erudito nem popular, somos linguagens. Entramos na obra porque ela está aberta e é plural. Somos poeta e guerreiros do amanhã. A poesia escreverá, enfim, a verdadeira história. Viva Patativa do Assaré e Oswald de Andrade.

De 2000 para cá eu andei revendo algumas questões. Na verdade, não sou exatamente eu ou os mauditos que nos apresentamos como os “diferentes”, são os “iguais” que nos acusaram de não saber fazer cordel, de trair o cordel tradicional. Muitos sustentam que  nós não fazemos literatura de cordel porque nós estamos quebrando tabus e questionando  dogmas do cordel. Mas isto já é tão previsível que meu cordel tem sido acusado de muitas coisas. Eu mesma já sofri ameaça até de morte por causa dos cordéis, já fui ameaçada de processo. Mas eu vou e faço outro cordel ou então parafraseio o poeta Pessoa e indago: viver é preciso? Viver para mim só é possível e só é necessário fazendo poesia, vivendo poesia, dizendo poesia. Enfim, cordelirando....

UOO: Você já compôs cordéis específicos sobre a questão homossexual e lésbica. Quais são?
SM: Compus vários cordéis ditos gays, sim. Falo sobre o que me mobiliza, sobre o que me diz respeito. Tudo que é humano nos diz respeito, disse o filósofo. Os homossexuais, homens e mulheres, dizem que sem eles os direitos não são humanos e eu poetizo: Sem os homossexuais não existe humanidade, não existe poesia. Então, eu escrevo sobre isto, sim.

Meu primeiro cordel ostensivamente gay eu comecei a rabiscar sozinha e aí eu resolvi convidar uma cordelista da sociedade dos mauditos, a Fanka, para produzir comigo, em parceria. O nome deste cordel é A HISTORIA DE JOCA E JUAREZ, que versa sobre um romance que se passou em 1913, na cidade de Juazeiro. Trata-se de um amor proibido entre um zabumbeiro e um jardineiro do Padre Cícero. Procuramos retratar o discurso da igreja, a hipocrisia social e intercalamos personagens fictícias com figuras reais. É um cordel romanceado publicado em 2001.

Mas existem muitos outros que escrevi sozinha, tais como O GRITO DOS MAU ENTENDIDOS que versa sobre uma assembléia de homossexuais, onde eu brinco com personagens do mundo artístico e falo de um evento onde se discute a discriminação e a violência contra gays, tudo intertextualizando com músicas que tem um sentido gay, etc.   Tem outro chamado O QUE É SER MULHER? que não é unicamente gay, mas provoca uma discussão sobre as sexualidades e há uma passagem em que eu pergunto se um homem não pode ser mulher ou se uma mulher não pode amar outra mulher e tal. Tem um outro intitulado DIA DO ORGULHO GAY, no qual eu narro a origem da data do orgulho. Tem um que se chama DO DIREITO DE SER GAY (ou condenando a homofobia) que é próprio para o teatro e que foi recitado pela poetisa Dath Haak.

Tem um que se chama LESBECAUSE onde eu faço uma ode às lesbianas. Tem o que se chama MULHERES FAZEM, onde eu brinco com possibilidades... E, por último, MARIA, HELENA que narra um romance entre duas mulheres do sertão, devotas, simples e lésbicas. Todos estes cordéis podem ser acessados no blog ou então consultados no acervo da cordelteca do SESC de Juazeiro do Norte. 

UOO: Os cordéis têm uma função didática, entre outras. Como tem sido a reação do público hétero aos cordéis de temática homo?
SM: Com efeito, o cordel tem uma função didática, educativa, sim. Para se ter uma idéia, muitas pessoas no Ceará foram alfabetizadas a partir do cordel. A literatura de cordel foi a minha primeira literatura. Todavia, muitos textos de cordel também podem trazer grandes problemas para a formação, para a educação das pessoas. Li, na infância, um cordel chamado A Peleja do Cego Aderaldo com Zé Pretinho. Este cordel reproduz muito preconceito, é baseado em estereótipos de cego imprestável, inútil e de negro sujo, incapaz...   

Às vezes me torno antipática denunciando estes “clássicos” que muitas vezes são enaltecidos até mesmo por acadêmicos, mas que na verdade são textos extremamente nocivos à idéia de respeito às diferenças, etc. Tenho recebido muitos elogios e muitas críticas também não apenas pelos cordéis de temática homossexual. Mas também tenho recebido prêmios e tenho sido alvo de muito interesse por parte de pessoas que acham que faço um trabalho legal. Na verdade a minha literatura, ou o meu “cordelírio”, tem cumprido uma função política muito forte, assumida e declarada.

Eu realmente gosto e me alimento deste tipo de arte que, infelizmente ainda é bastante marginal, secundária, periférica, menor e desimportante nos círculos e circuitos literários. Por meio dela, eu cuido de questões também consideradas ácidas, inconvenientes, incômodas, etc. Porém, alguns pesquisadores no Brasil já estão investigando academicamente, em nível de especialização, mestrado e doutorado o meu trabalho. Ganhei dois prêmios nacionais de literatura de cordel que me foram concedidos pela Fundação Cultural do Estado da Bahia-FUNCEB nos anos de 2005 e 2006, respectivamente. Em Juazeiro, cidade onde moro, os gays recitam meus cordéis antes de abrir palestras, debates, etc. Há artistas dramatizando meus textos, inclusive o cordel DO DIREITO DE SER GAY, que é um monólogo num tribunal do júri.

Muitos dos meus textos são feitos para o teatro. Então, a temática homo tem chamado a atenção do público, sobretudo pelo fato de vir a partir da literatura de cordel.   A Revista Cult, de 2003, salvo engano, traz um dossiê sobre literatura gay, onde se indaga se é uma bandeira política ou um gênero literário. O professor Gilmar de Carvalho, grande conhecedor da literatura de cordel, tem um texto nesta revista onde ele fala da nossa produção, cita inclusive meu trabalho. Então, em geral, tem sido boa, algumas pessoas estão considerando a nossa produção de cordel como um todo e em especial os de temática  gay, lésbica, enfim, homossexual. 

UOO: Além de elaborar cordéis, você desenvolve outras atividades em prol da cidadania LGBT? 
SM: Veja, sou professora do departamento de Direito da Universidade Regional do Cariri-URCA, fiz opção por ser uma advogada popular, com formação em direitos humanos, estudos gênero, feminismos, mulheres, sexualidades. Concluí em 2002, uma dissertação de mestrado intitulada O Princípio da Igualdade Jurídica e a Discriminação contra Homossexuais: ações e omissões dos poderes públicos no Brasil, pela Universidade Federal do Ceará.

Elaborei os estatutos de duas ONGs Gays no Cariri cearense. Dei assessoria jurídica gratuita a estas entidades, ajudando, portanto, a construção da cidadania LGBT numa região onde há um forte componente de machismo e homofobia, mormente em face da tradição religiosa. Realizei inúmeras palestras, participei de muitos debates, escrevi e ainda escrevo textos sobre o assunto, publiquei na Revista Artemis, etc. Procuro dar minha contribuição.

Estive em Cuba dialogando com mulheres lésbicas e heterossexuais sobre gênero, direito, etc. Sou também um ser cuja sexualidade está em permanente construção. Portanto, não dou uma contribuição desinteressada. Eu, de alguma forma, também sou gay, minhas idéias, meu modo de ser e estar no mundo é marginal, é questionador, é periférico, é gay, por excelência.

UOO: Muita gente vem reclamando hoje em dia da burocratização do Movimento LGBT, apontando seu distanciamento da população LGBT e propondo atividades artísticas como forma de fazer política por uma via menos chata. O que você acha disso?
SM:  Eu penso que é por aí. A aproximação e até a própria (con)fusão do movimento LGBT com os partidos e com o poder institucionalizado muitas vezes engessa, sufoca, imobiliza. A realidade tem demonstrado isto. Não sou uma pessoa anti-partido, ao contrário, já fui até candidata ao governo do meu Estado nas eleições de 2006. Aliás, a única a defender publicamente a criminalização da homofobia e a união entre pares do mesmo sexo naquele habitat. Estou, como muita gente neste país, com um pé atrás com esta política que vivenciamos, que nos fora vendida com um discurso e que se nos apresenta de modo torto, obtuso, enfim.   

cordelTampouco faço um discurso da arte pela arte. Penso que  política e poesia é reflexão e ação constante. A discussão de tudo o que interessa aos seres vivos deve ocupar estes espaços. O discurso pela veia artística é um discurso prazeroso. Costumo dizer que faço uma poética-político-exótico-erótica. Não faço nada sem o prazer de fazer e de viver. Não suporto o amordaçamento da criatividade em nome de uma ideologia, de um edital, de uma campanha, de uma candidatura, de uma burocracia que visa domesticar e roubar a radicalidade da luta pelo respeito ao ser humano. Penso que podemos avançar dialogando com todos e todas que desejam um mundo melhor sem nos algemar, sem nos impedir de grita contra toda e qualquer espécie de opressão, institucionalizada ou não.

UOO: Por fim, deixe uma mensagem para nossas leitoras.
SM: Quero dizer que para mim foi um prazer falar para vocês. Quero seguir dialogando. Tenho um texto que diz que Um outro direito é possível. Tento construir um outro olhar sobre o mundo jurídico, e também sobre a arte em geral, sobre a literatura e em especial sobre a literatura de cordel. Ou seja, partilho com vocês da idéia de que é possível lançar UM OUTRO OLHAR sobre tudo, mormente sobre as sexualidades. Então, me encho de entusiasmo com o contato com gente que quer ser feliz, que quer amar e que pensa que a arte pode ser um modo de se publicizar isto. Obrigada por me ajudarem a seguir cordelirando sempre e mais. Um abraço afetuoso para todas.

Publicado originalmente no site Um Outro Olhar em 24/04/09

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